Bom futebol e superação são destaques na Taça Cidade de São Paulo

Família de atleta do Muvuca largou vida estável em Minas Gerais para tratar duas síndromes raras do jogador

Ponta-direita da Associação Atlética Muvuca, Franklin José Ferreira dos Santos costuma chamar a atenção de organizadores, técnicos e público da Taça Cidade de São Paulo de Futebol Masculino. Mais do que o bom futebol, a história de vida do atleta é o motivo do destaque.

Aos 14 anos, Franklin tem 1,20m de altura. O crescimento deficiente é ocasionado por duas síndromes: a acidemia metilmalónica (desordem hereditária que impede o organismo de processar certas proteínas e gorduras corretamente) e a displasia espondilocostal, doença caracterizada por anomalias vertebrais e costais que resultam em má formação óssea. As duas doenças provocaram uma infecção generalizada no garoto quando ele ainda tinha um ano e meio de idade.

Em Montes Claros (MG), cidade onde a família vivia na época, a rotina já envolvia hospitais: com diagnóstico inicial de bronquite e pneumonia, o garoto, que havia nascido com aparência sindrômica, ficava internado três dias por semana, em média. Na última internação, a pediatra foi categórica: Franklin não teria chances de sobreviver se continuasse ali. “Foi um baque. Todas as crianças que estavam ao lado dele no hospital foram falecendo, o que nos deixava mais desesperados. Além disso, lá não havia UTI infantil”, relata Cleuber Pereira, pai de Franklin. Ao ver o filho naquela situação, o pai pediu demissão em seu emprego, vendeu parte de seus bens materiais e veio para São Paulo às pressas, em uma tentativa de salvar a vida de Franklin.

Nos primeiros dias em São Paulo, a família também enfrentou outra dificuldade: uma enchente atingiu a região do Jardim São Gonçalo, em São Mateus, e alagou a casa onde Cleuber e a família moravam. Os poucos móveis trazidos de Minas Gerais não foram recuperados depois dessa inundação. Nesse período, Franklin ficou na casa de uma de suas tias, em Guarulhos, Grande São Paulo.

Com a saúde ainda mais debilitada, o menino foi sedado para a realização de exames. Naquele dia, Franklin José entrou em coma e passou 30 dias na UTI do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas (HC). Antes do diagnóstico final, o garoto foi desenganado pelos médicos brasileiros. Seus exames foram enviados para laboratórios no Canadá e no Japão. No segundo país, descobriu-se que Franklin era portador de duas síndromes raras. Atualmente, ele é considerado o único no mundo a ter acidemia metilmalónica e displasia espondilocostal.

Durante o ano, Franklin vai ao HC quatro vezes e faz exames nas áreas de ortopedia, genética, neurologia e dermatologia. Em média, o trajeto entre a casa do atleta, em São Mateus, e o Hospital das Clínicas é de duas horas. Apesar dos problemas de saúde, a família de Franklin nunca o tratou de forma diferenciada. “Criei meu filho como uma criança normal, sem transmitir para ele qualquer sentimento de pena. Sinto-me muito feliz ao saber que ele está conquistando algo que gosta”, conta Istael Santos, mãe de Franklin, ao fazer referência ao futebol. A partir dos 10 anos, o garoto passou a demonstrar mais interesse pelo esporte.

Tempo depois, ele começou a jogar no Boa Esperança, outro time da região de São Mateus, zona leste de São Paulo. A carreira esportiva de Franklin já conta com premiações: quatro medalhas individuais na Taça Cidade de São Paulo, um título com a equipe do Boa Esperança e duas conquistas nas Paraolimpíadas Escolares. As premiações ficam na cozinha da casa, para que todos os visitantes conheçam as conquistas do jovem atleta. “Ver meu filho bem desse jeito não tem preço”, finaliza Pereira.

No ângulo

No Sub 12 do Muvuca, Franklin é elogiado pelo técnico Torô: “ele é fundamental no jogo coletivo. O Franklin é bom de bola e joga muito melhor que alguns meninos sem distúrbios de crescimento”, afirma. Torcedor do Corinthians, o ponta-direita ganhou o apelido de “Jorge Henrique” assim que chegou ao Boa Esperança: “Quando comecei a jogar no Boa, um dos treinadores começaram a me chamar de Jorge Henrique porque sou baixinho. Aí o apelido ficou”, explica o jogador. Gustavo e Bruno, colegas de classe e de time de Franklin, ajudam a justificar o apelido: “Ele também é muito rápido”, afirma um deles.

Foi de um pênalti que surgiu o melhor gol da carreira de Franklin José, segundo seus colegas. Derrubado por um jogador adversário dentro da área, o garoto quis cobrar a penalidade máxima do futebol. Apoiado pelos companheiros de equipe, que gritavam “deixa ele bater, deixa ele bater”, Franklin obteve a autorização de Torô para a cobrança. Depois do apito do juiz, ele acertou a bola no ângulo do gol adversário. O acerto foi comemorado de forma especial. Os pulos de alegria do técnico depois do gol ficaram gravados na memória de todos os jogadores.

Ainda dentro das quatro linhas, outra curiosidade na história de Franklin chama a atenção: o garoto já foi torcedor dos três maiores times da cidade de São Paulo. “Eu era palmeirense. Meu tio começou a falar que eu deveria ser são-paulino. Então eu mudei de time. Ele chegou a comprar várias roupas do São Paulo para mim. Depois meus amigos começaram a falar: ‘Franklin, torce para o Corinthians, é um time muito bom’. Eu mudei de novo e torço para o Corinthians até hoje”, assume. Franklin, assim como seus companheiros, sonha em assistir a uma partida oficial do time do Parque São Jorge em um estádio.

O sonho de Franklin? Ser jogador de futebol. A tentativa mais recente de realizar esse sonho foi uma peneira da Ponte Preta, que aconteceria em São Mateus. No dia, a chuva impediu a realização da seletiva. Ao ser questionado sobre outras possibilidades para o futuro, o garoto preferiu o silêncio. Estudante da sexta série do Ensino Fundamental, Franklin gosta de matemática, tira boas notas e ainda tem o comportamento elogiado pelos professores na reunião de pais.

O dia 01º de dezembro de 2013 ficará gravado na história de Franklin José. Nessa data, o garoto pisará no gramado do Estádio do Pacaembu pela primeira vez. A expectativa é a de que o atleta entre na partida contra o “Amigos do Guima” apenas no segundo tempo. Até lá, a única certeza é a de que os amigos e vizinhos vão chamá-lo para jogar bola todos os dias, rotina mais do que consolidada entre aqueles garotos.

Texto e fotos:

Juliana Salles - jsalles@prefeitura.sp.gov.br

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