Dia Nacional dos Povos Indígenas: como um serviço criado há pouco tempo faz muito pelas aldeias de Jaraguá

Inaugurado no início de abril, o CCInter “Estrela do Amanhã” é voltado para as aldeias locais da região de Pirituba/Jaraguá

Texto: Arthur Martinez
Imagens: Samuel Fragoso

Na imagem, temos jovens indígenas atendidos no local. Da esquerda para a direita, um garoto de blusa cinza e bermuda preta, uma garota de blusa branca e calças vermelhas, outra menina de blusa preta e bermuda bege, e uma mulher mais velha, de óculos e blusa preta. Mais na frente, duas meninas bem mais novas. O cenário é de vegetação bem vivida.

 

No extremo norte da capital, no bairro de Jaraguá, estão localizados sete grupos indígenas: as aldeias Tekoa Ytu, Tekoa Pyau, Itakupé, Yvy Porã, Ita Endy, Itáwera e Aldeia Ytu. Elas, assim como a maioria dos povos tradicionais indígenas no Brasil, enfrentam desafios e barreiras diários simplesmente por serem quem são. Preconceito em ambientes públicos, a invasão de seus espaços de moradia e convivência e a continuidade de sua cultura ameaçada pela modernidade preocupam e afetam o dia a dia dos moradores das aldeias.

 

Com o intuito de promover mais um espaço para que a população indígena de São Paulo possa ensinar e perpetuar sua cultura, o Centro de Convivência Intergeracional (CCInter) “Estrela do Amanhã” foi inaugurado no dia 1º de abril deste ano e já está em pleno funcionamento. A aproximação das aldeias com o serviço está acontecendo aos poucos, uma vez que, não só na região, mas como em toda a rede socioassistencial de São Paulo, o serviço é o primeiro voltado para pessoas indígenas.

 

Jonatas Fernandes Martins, em português, ou Karai Djekupe, em guarani, tem 39 anos, é morador do território indígena de Jaraguá e trabalha no CCInter como técnico de educação física, curso no qual se formou em grau superior. Ele também já passou por situações difíceis envolvendo preconceito ao longo da vida e pensa que o serviço em que trabalha pode ser um ponto de partida para algo ainda maior.

 

“Sofri preconceito durante a escola, muitas piadinhas e conversas que você ouve estando no meu lugar, até na própria faculdade, com menos frequência, mas acontecia. Mas isso não me desanimou nos estudos, consegui me formar. Uma das lideranças aqui da nossa aldeia parou de estudar porque foi agredido pelos colegas da escola justamente no Dia dos Povos Indígenas”, relata.

 

Karai Djekupe acredita que o equipamento seja de extrema importância, principalmente para os jovens do Território Indígena, que acabam sendo atraídos por celulares e telas. “Eles acabam tendo desinteresse por conhecerem a história do próprio povo. São muito propensos a sair do caminho e, quando não estão na escola, têm muito tempo ocioso”, comenta.

 

Agora, com o CCInter, o educador físico tem esperança de que as tradições das aldeias sejam perpetuadas com maior facilidade e adesão dos mais jovens. “Podendo estar nesse equipamento, eles têm a chance de cuidarem de sua saúde tanto física quanto mental. Também é importante, pois todas as atividades desenvolvidas aqui dentro vêm do Guarani, e isso fortalece nossa cultura e resgata a participação de pessoas da tribo que perderam parte do interesse por ela. Estou muito empolgado e muito esperançoso com o futuro do CCInter”, finaliza Jonatas antes de definir o novo serviço como indispensável.

 

Para a Eunice Augusto Martins, ou Djera Poty Jú, nome em guarani que significa ”semente da flor amarela”, de 69 anos, o CCInter é um importante meio de conscientização e preservação de suas culturas. Ela, que é professora de saberes tradicionais em uma escola do Território Indígena e filha do primeiro guarani da região de Jaraguá, crê que o serviço pode ajudar a combater um preconceito que esteve presente durante toda sua trajetória.

 

“Fui tirada do meu povo quando era criança, na época da ditadura militar, porque peguei tuberculose. Saí do hospital já com dez anos, e não estudei por conta disso. As crianças do primeiro ano tinham sete e eu já era mais velha. Lá, elas me chamavam de cabeça de peixe, cabeça de piolho, me mandavam abrir os olhos. Por conta disso, eu aprendi tudo que eu sei lendo sozinha, só fui estudar em uma sala de aula com 34 anos, e consegui me formar no segundo grau e em seguida me tornar professora”, conta.

 

Por ser professora de saberes tradicionais, Djera Poty Jú se preocupa com a preservação da cultura e como as novas gerações não estão tendo o contato e o interesse em descobrir a própria história. Para ela, a expectativa é que o equipamento funcione como uma grande troca de saberes entre os povos indígenas e não-indígenas e como preservação e propagação de hábitos e costumes dos povos tradicionais da região: “Têm pessoas que moram aqui, do nosso lado, e não sabem que estamos aqui”, destaca, afirmando estar animada para o futuro.

Uma imagem em plano bem aberto, com várias pessoas de diferentes idades, prestando atenção em uma indígena que está sentada no meio da roda. O cenário é de natureza, com uma fogueira e um poço de tijolos.

 

Dia dos povos indígenas

Anualmente, em 19 de abril, é celebrado o Dia dos Povos Indígenas. Esta data destina-se a honrar a riqueza cultural das comunidades indígenas do Brasil, ao mesmo tempo em que nos leva a refletir sobre os desafios enfrentados por elas e a necessidade de proteger seus direitos.

Embora seja considerado um dia de celebração, ativistas veem o 19 de abril como uma oportunidade para uma reflexão mais profunda sobre a situação deste público no Brasil, destacando a importância de garantir seus direitos e proteger suas culturas.