CAE Ebenezer: Há 1 ano fazendo de São Paulo um lugar para recomeçar

Já tendo acolhido 1.007 imigrantes, o serviço dá oportunidades para uma nova vida no Brasil

Texto e Fotos: Ana Luiza Martins e Samuel Fragoso

Um homem vestindo camiseta branca com bordado vermelho no canto direito está parado, olhando para a foto. Atrás dele há uma quadro com a bandeira do Brasil e a bandeira do Afeganistão se encostando.


Em uma movimentada avenida na região da Penha, zona leste de São Paulo, o que antes era um hotel se tornou um lugar de recomeço para diversas pessoas. No dia 16 de setembro de 2022, foi inaugurado o Centro de Acolhimento Especial (CAE) - Ebenezer.


Desde o início de seu funcionamento, o CAE já acolheu 1.007 pessoas em situação de vulnerabilidade social, sendo 981 delas imigrantes afegãs. Considerando somente o primeiro semestre de 2023, o número chega a 743 pessoas, o que representa um aumento de 367,3% em comparação ao mesmo período do ano anterior.


Um destes acolhidos é Obaidullah Hassanzai. Ele chegou ao Brasil no ano passado e precisava de ajuda para se reerguer. “Saí do Afeganistão por causa do Talibã. Isso se tornou um problema para mim, porque eu trabalhava na polícia”, conta.


Ele veio ao país sozinho e disse que gostou do Brasil desde o início. “Aqui não tem guerra, não tem problema. O Brasil é um país muito bom”, afirma. Quando chegou, ele ficou no Centro Esportivo Vila Independência, na zona sul, serviço emergencial que pertencia à Operação Baixas Temperaturas de 2022.


Logo depois, Obaidullah se mudou para o Ebenezer para trabalhar na Organização da Sociedade Civil (OSC) CEBASP, responsável pela administração do CAE Ebenezer. “Eu ajudo quando os que chegam precisam de documento, CPF, Bolsa Família”, explica.


Para Adriana Furlaneti, gerente do CAE, ter funcionários afegãos no quadro de recursos humanos é importante para a humanização do serviço. “É fundamental. São os colaboradores afegãos que vão transferir nossos direitos para eles, que são direitos deles também, garantidos na Constituição. São eles que vão fazer mediações de conflitos, que vão, por diversas vezes, trazer as demandas que eles precisam. Eu acho importante, e o que torna também o serviço mais humanizado”, relata.


É importante ressaltar que não são só afegãos que são acolhidos no serviço.Só em 2023, até o mês de agosto, foram feitos 836 acolhimentos de imigrantes de quatro diferentes nacionalidades.


Além disso, com o objetivo de melhorar cada vez mais o atendimento dos acolhidos, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) faz visitas semanais no serviço.


Nas visitas, eles orientam a equipe técnica sobre o atendimento personalizado para a população imigrante, auxiliam com as demandas principais e referentes aos últimos questionamentos. Além disso, eles também auxiliam o serviço com a facilitação dos documentos dos acolhidos recém-chegados.


Outra frente de atuação do CAE Ebenezer passa pela inserção dos acolhidos no mercado de trabalho. “Aqui é um ótimo lugar para nos apoiar, para nos deixar prontos para nos tornarmos independentes”, declara Sadeq Khodadadi.


Sadeq tem 41 anos e veio para o Brasil no ano passado com a sua família. Fugindo do governo do Talibã, ele deixou uma empresa própria, seus familiares e diversos sonhos para trás.


Ele, seus dois filhos e sua esposa passaram cinco noites no Aeroporto Internacional de Guarulhos e foram encaminhados para o sul do país, onde ficaram acolhidos por três meses.


Após esse período, o CAE Ebenezer se tornou seu novo lar. “Eu acho que aqui temos uma chance melhor, uma oportunidade melhor na vida”, revela Sadeq sobre sua experiência em São Paulo.


Hoje, vivendo no Brasil, Sadeq, que trabalhava com telecomunicações no Afeganistão, corre atrás de realizar novos objetivos, criados em solo brasileiro.


Tanto ele quanto Obaidullah sonham em ter suas casas e ajudar os familiares que ainda estão no Afeganistão.“Meu plano é criar a minha própria empresa, seria melhor para que eu possa continuar sustentando minha família no Brasil”, comenta Sadeq.


Neste sentido, o CAE Ebenezer é um local que auxilia seus atendidos a atingirem suas metas. Somente em 2023, 21 das 37 saídas qualificadas – quando o acolhido sai da rede socioassistencial por conquista da autonomia – tiveram como motivo a inserção no mercado de trabalho. Os outros motivos são moradia autônoma, moradia provisória e retorno à convivência familiar extensa.


Apesar de todos os cuidados prestados pelo serviço, o idioma continua sendo uma barreira. A comunicação é de extrema importância para as relações sociais, por isso Sadeq sofre com a dificuldade na hora de conversar em português. “A língua é um problema grande para nós, para superar esse problema é muito difícil”, confessa.


Para contornar esta situação, Sadeq participa das aulas de português oferecidas pelo serviço em parceria com a Escola Municipal de Educação Fundamental (EMEF) Carlos Chagas, que fica próxima ao equipamento. As aulas acontecem duas vezes por semana, sempre no período noturno, desde fevereiro de 2023. De lá para cá, aproximadamente 70 pessoas participaram do programa.


Além desta parceria intersecretarial entre a SMADS e a Secretaria Municipal de Educação (SME), desde outubro de 2022, o serviço disponibiliza aulas de português em parceria também com o Instituto Educação Sem Fronteiras, que oferta um curso do idioma para refugiados dentro do equipamento.


O CAE adaptou seu espaço e construiu uma sala para que as aulas fossem ministradas. Desde o início, 150 atendidos divididos em seis turmas puderam participar.

Um homem vestindo camisa azul, colete marrom e um crachá branco com fita azul está parado, olhando para a foto. Atrás dele há uma quadro com a bandeira do Brasil e a bandeira do Afeganistão se encostando.


Sabrina Kakar tem 19 anos e percebe diariamente como saber o português pode facilitar a vida de alguém. O marido dela conseguiu desenvolver seu aprendizado na língua e hoje trabalha para a CEBASP. “Quando as pessoas chegam no Brasil, ele auxilia na transferência para o Centro de Acolhida e as ajuda com o português”, frisa.


A história de imigrantes como a Sabrina mostra que, às vezes, o idioma não é o maior empecilho. Ela e o marido superaram, como família, diversas barreiras para chegarem onde estão. Eles saíram do Afeganistão no ano passado por contadas dificuldades vividas. “A vida era muito difícil. Nenhum dinheiro, sem escola, a situação era muito ruim”, relembra.


Ao chegar ao Brasil, junto de seu filho de 1 ano, o marido e os sogros, Sabrina passou três meses em um centro de acolhimento em Guarulhos e, só depois do fim de sua estadia no local,a família foi transferida para o CAE Ebenezer.


“Lá, todas as mulheres ficavam em um quarto e os homens em outro. Eu estava em um quarto e meu marido e filho em outro quarto. Aqui, nós estamos juntos, em família”,recorda Sabrina, afirmando que gosta de viver no CAE.


Para ela, o serviço é um local bom de se viver, onde as pessoas são amigáveis e gentis. “Quando eu quero ajuda, eles me ajudam. É muito bom”, finaliza.