Saúde também combate violência doméstica

Cidade Tiradentes finaliza 3º módulo de projeto que capacita agentes comunitárias da saúde a atuar em territórios de vulnerabilidade

Mais de 30 agentes comunitárias de saúde receberam certificados no curso para sensibilizar a população sobre a violência doméstica

 

Por Vanessa Santos (colaborou Cecilia Figueiredo)

A violência contra a mulher fere gravemente os direitos humanos e o desenvolvimento de uma sociedade democrática. Por essa razão, o combate a todos os tipos de violência contra a mulher deve se tornar um hábito saudável. Essa foi a discussão abordada no último encontro do Fórum Cultura de Paz da Cidade Tiradentes, no dia 28 de agosto, na Escola Técnica de Saúde Pública Professor Makiguti.

Na ocasião, receberam certificados no curso para sensibilizar a população sobre a violência doméstica mais de 30 agentes comunitárias de saúde (ACS) das Unidades Básicas de Saúde (UBS) Inácio Monteiro, Dom Angélico, Gráficos, Ferroviários, e Jardim Vitória, envolvidas no projeto de prevenção da violência doméstica contra as mulheres e o Grupo de Enfrentamento da Violência Doméstica (GEVID).

As capacitações são realizadas desde 2014, com equipes de todas as unidades da Supervisão Técnica de Saúde Cidade Tiradentes, numa parceria da Coordenadoria Regional de Saúde Leste (CRS Leste), ESF e GEVID, do Ministério Público do Estado de São Paulo. A exemplo da edição anterior, agora as ACS irão para as comunidades compartilhar esclarecimentos recebidos sobre a violência doméstica nas visitas domiciliares.

Alcance da capacitação

Fabíola Sucasas Negrão Covas, promotora de Justiça do GEVID e idealizadora do projeto, elogiou o trabalho das agentes comunitárias e destacou a importância da continuidade para que os serviços tenham efeito. “Embora a Lei Maria da Penha seja um instrumento de punição, ainda falta conhecimento e divulgação para sua eficácia”, enfatizou a promotora, ao ler a citação feita por uma ACS em seu trabalho.

A supervisora técnica de saúde de Cidade Tiradentes Marta Pozzani avalia que o projeto de prevenção à violência ganha mais efetividade pela figura da agente comunitária de saúde, “a ponte entre a comunidade e o serviço de saúde”. E justifica: “As agentes não apenas fazem prevenção em suas comunidades, como também conhecem as vítimas e seus agressores”.

Relatos das ACS

Para a ACS Raimunda Santos, que há dois anos atua na UBS Gráficos, a capacitação do GEVID ajudou na abordagem. “Instrumentalizou a gente. Agora temos o esclarecimento, abriu o horizonte e hoje eu me sinto mais segura para orientar”, disse.

Eliane Ferreira Silva, ACS da UBS Dom Angélico, concorda com a colega e relata as estratégias utilizadas para abrir de forma natural a conversa que, muitas vezes, ocorre com o agressor ao lado da vítima. “Eu inicio a conversa citando as causas que mais matam mulheres no mundo, como o câncer de mama e o do útero, por exemplo. Digo que entrego a todas as famílias, sem restrição”, exemplifica.

Ela lembrou o caso de uma cadastrada que foi procurá-la na unidade em busca de socorro, após a visita domiciliar. Com os sintomas da Síndrome do Desamparo Aprendido – desmotivada a reagir à violência -, a vítima confidenciou à ACS que já havia tentado o suicídio. Para motivá-la, Eliane conversou longamente com a cadastrada. “Uma nota de 100 reais, se jogada ao chão, continua valendo 100 reais. Se alguém pisa em cima dela, continua com o seu valor”, comparou Eliane. “Independente do que ele diga, você continuará tendo o seu valor para a sociedade”, ressaltou a agente comunitária.

Alternativas

O caso a impactou tanto que a ACS buscou alternativas para a reintegração da vítima. “Fiz um levantamento de alguns sites de emprego, orientei-a ao grupo de tratamento do tabagismo; ela parou de fumar e conseguiu um trabalho”, afirmou Eliane.

Catarina P. Jesus Santos, ACS que atua há cinco anos na UBS Dom Angélico, comentou a influência que o GEVID teve em sua forma de ver o mundo e nas suas crenças. “Dentro da igreja você tem ilusão de achar que tudo é perfeito, e não é. Eu percebi que tem muita mulher que sofre violência doméstica, mas não denuncia, por ser evangélica, não quer escandalizar o cristianismo e nem desmerecer sua crença. Porém, com a nossa intervenção, elas passam a entender que a violência sofrida não é obra de Deus. Começam a entender que não são as culpadas e passam a ganhar coragem para denunciar”, afirma a agente, que é evangélica.

O evento, que reuniu também o representante da CRSL, Sérgio Matsudo, possibilitou ainda a troca de experiências entre as agentes comunitárias de saúde, o esclarecimento de dúvidas sobre a abordagem à população, a cartilha Mulher, vire a página, medidas protetivas asseguradas pela Lei Maria da Penha.

Projeto de Prevenção à Violência Doméstica

Desenvolvido como piloto em 2014, o projeto capacitou 60 agentes comunitárias de saúde no primeiro ano atingiu 13 mil pessoas. Em 2015, a proposta é fazer o projeto contemple toda a Cidade Tiradentes, distrito que concentra cerca de 300 mil pessoas. Na edição deste ano, 26 mil exemplares da cartilha devem ser distribuídos por 110 agentes comunitários de saúde nas regiões das UBS Ferroviários, Gráficos, Profeta Geremias, Barro Branco e Carlos Gentile.