Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania inicia trabalho pró-egressos com participação de organizações e movimentos sociais

Outros encontros serão realizados nos próximos meses para construir a regulamentação da Política Municipal de Atenção à População Egressa e Familiares

Com relatos fortes de pessoas egressas e familiares participantes de coletivos, mas também histórias edificantes de organizações da sociedade civil que prestam apoio a essa população, foi realizado no dia 14 de julho, no auditório da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), o 1º Encontro sobre a Política Municipal de Atenção à População Egressa e Familiares.

O objetivo é possibilitar a ação participativa para a construção da nova política municipal, por meio de um grupo de trabalho que agregue a colaboração dessas instituições e de representantes do público-alvo.

A Lei 17.933/2023, que instituiu essa Política Municipal, foi promulgada este ano pelo Prefeito Ricardo Nunes, a partir de projeto de lei que tem como autores os então vereadores Eduardo Matarazzo Suplicy; Sâmia Bonfim; Patrícia Bezerra; Soninha Francine e o ainda vereador Toninho Vespoli.

O primeiro de diversos encontros que serão realizados mensalmente na sede da SMDHC contou com a participação de 95 pessoas, entre servidores de diferentes coordenações da Secretaria, 18 organizações e movimentos da sociedade civil, e representantes da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), da FUNAP (Fundação Professor Dr. Manoel Pedro Pimentel, que realiza o trabalho de reintegração social de pessoas privadas de liberdade), do Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, e Organização dos Advogados do Brasil (OAB-SP).

Participaram do evento a secretária municipal de Direitos Humanos e Cidadania, Soninha Francine; a secretária executiva de Promoção da Igualdade Racial, Elisa Lucas Rodrigues; a assessora Paula Santos de Jesus, da Coordenação de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos (CPDDH), à frente da equipe da Secretaria que articula o grupo de trabalho junto a egressos e familiares; do desembargador do Tribunal de Justiça do Estado, Luiz Antônio Cardoso, entre outras autoridades.

Depoimentos

Os participantes do encontro ouviram relatos de familiares de egressos e egressas participantes de movimentos sociais e coletivos. As principais queixas estavam relacionadas ao uso de violência no interior do cárcere, a dificuldade em conseguir documentos pessoais para o exercício da cidadania, como o título de eleitor, a falta de oportunidades de trabalho e dificuldades para a participação social após o cárcere.

Uma mãe denunciou que o filho saiu do sistema penal com sequelas físicas em decorrência da violência que sofreu. Uma egressa disse que foi presa por ser dependente química e condenada como traficante. Recebeu uma pena de um ano e oito meses e, em decorrência de um recurso ao Tribunal de Justiça; teve a pena estendida para cinco anos, e precisou voltar à prisão, mesmo tendo conseguido emprego e concluído o ensino superior.

Ressocialização

Houve também relatos de organizações e movimentos socias da sociedade civil que estão lutando para reintegração de egressos, da experiência de pessoas que conseguiram vencer as dificuldades e concluir os estudos, e que agora militam em coletivos e associações.

“Não podemos ser eternamente uma pauta negativa de imprensa. Por que só temos lugar de destaque quando a gente fere a sociedade?”, questiona Leonardo Precioso, o Léo, um ex-jogador de futebol que se envolveu com o tráfico de drogas, foi condenado e cumpriu pena.

Com a ajuda da organização da sociedade civil Gerando Falcões, ele criou o Instituto Recomeçar, que pelo seu trabalho em garantir a participação social após o cárcere, recebeu o Prêmio Movimento LED e o Selo de Direitos Humanos e Cidadania da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania.

Segundo Léo, o Instituto tem mais de 2.500 pessoas cadastradas e, de acordo com ele, a cada 500 pessoas atendidas pelo Recomeçar, 99% estão reintegradas à sociedade, frente a um índice nacional de 42,5% de reincidência carcerária. O Instituto atende no CIC (Centro de Integração da Cidadania) Ferraz de Vasconcelos, da Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, com equipes também em Brasília (DF), Recife (PE) e São José do Rio Preto (SP).

“A prisão não é uma ilha. Quem está na prisão é um munícipe”, afirma Fábio Pereira Campos, da Amparar (Associação de Amigos e Familiares de Presos), que atende egressos e seus familiares.

Ele defendeu a articulação e o trabalho conjunto de diferentes setores e órgãos do poder público para o apoio aos egressos e familiares, de acordo com as suas necessidades, citando como exemplo o direito de filhos de egressos de estudar e ir à escola.

O trabalho da Amparar teve início em 1990, direcionado à antiga Febem, hoje Fundação Casa, em cima de uma questão ainda presente no sistema carcerário, que é a reincidência do egresso. No caso do adolescente infrator, segundo Fábio, por falta de oportunidades, ele acabará fazendo parte no futuro da grande população carcerária do país.
Mulheres imigrantes

O Estado de São Paulo possui a maior população carcerária do Brasil, 195 mil pessoas de um total de 832,2 mil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023. Com uma população carcerária de tais dimensões, são muitos os desafios.

O Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) desenvolve um trabalho de garantia de direitos de mulheres imigrantes (CIS e transsexuais) que cumprem pena ou que saíram do sistema prisional. A entidade foi fundada em 1977 pela missionária e advogada Michael Mary Nolan.

Elisa Bonda integra a equipe do ITTC e conta que as mulheres imigrantes sofrem problemas que afetam as detentas em geral, mas com algumas particularidades, entre elas, a falta do domínio do idioma que dificulta ainda mais a situação delas.

“Muitas estão lá sem saber o que fazer, sem poder se comunicar e sem qualquer apoio ou advogado, sequer de um defensor público”. Ela cita um caso recente de mulheres que foram detidas por tráfico de drogas nos aeroportos, e que, segundo se suspeita, foram utilizadas pelo crime internacional de tráfico de pessoas.

Essas mulheres vêm de cárcere privado e sob ameaças a familiares são obrigadas a traficar. Neste caso, o ITTC trabalha para esclarecer agentes como promotores e juízes das questões que estão por trás do encarceramento de mulheres imigrantes e de suas necessidades.

Na Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, o trabalho do grupo está apenas no seu início. A próxima reunião com organizações e movimentos sociais está marcada para o dia 8 de agosto.