"Bosque tombado na Augusta pode ter torres de 40 andares"

Fonte: O Estado de S. Paulo 

Entidade de moradores é contra: quer parque público no terreno, particular, de 24,2 mil m²

Sérgio Duran

Já se pensou em hotel. Ano passado, o plano era de um hipermercado. Mas até agora o terreno de 24,2 mil metros quadrados nas esquinas das Ruas Augusta, Caio Prado e Marquês de Paranaguá, centro de São Paulo, tem servido mesmo é para estacionamento. Até a década de 1970, abrigou o Colégio Des Oiseaux, reduto das paulistanas de fino trato que tinham o privilégio de estudar com freiras agostinianas belgas.

Na reunião de hoje do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico (Conpresp), há um projeto polêmico a ser apreciado que tenta dar novo destino à área - o de condomínio residencial. Restos de muro, uma casa pequena e um bosque com árvores nativas, tombados pelo Conpresp, são tudo o que restou do colégio.

Desenvolvido pelo arquiteto Décio Tozzi para a construtora Setin, o projeto prevê a construção de quatro torres, de 35 a 40 andares cada uma, e a transformação da romântica área verde em um parque público, com acesso facilitado e visualização a distância, mesmo com os arranha-céus na frente. A altura incomum dos edifícios, conta o arquiteto Antônio Setin, presidente da construtora, é para deixar a área térrea ainda mais livre.

“Pela legislação, o espaço abrigaria muito mais torres do que quatro, mas essa não é a nossa idéia. O bosque é tão importante para a cidade quanto para o empreendimento”, explica Setin. “É a nossa aposta para a revitalização do centro de São Paulo. Famílias morando naquela região é tudo o que falta para requalificá-la.”

As boas intenções, no entanto, não foram suficientes para fazer com que o projeto fosse bem recebido pela Sociedade Amigos e Moradores de Cerqueira César (Samorcc), que há anos luta pela construção de um parque público, ocupando não só os cerca de 10 mil m² de área verde, mas todo o terreno. Ano passado, o grupo conseguiu barrar a construção de um hipermercado do Wall Mart no lote com a mesma idéia do parque público no bosque.

“A gente não precisa mais de prédios e sim de verde. O bairro já está saturado de concreto”, diz a presidente da Samorcc, Célia Marcondes. “Torres dessa altura irão piorar a qualidade de vida da nossa região.”

Pelo projeto de Célia, a Prefeitura desapropriaria a área pagando com certificados de potencial construtivo, que permitiram ao proprietário - o banqueiro Armando Conde - vender a outras construtoras. O Estado apurou que ambas as partes envolvidas na disputa buscam apoio direto do prefeito Gilberto Kassab (DEM). “Nós estamos esperançosos de que o prefeito reverta isso”, afirma Célia.

Já Setin prefere apostar no que avalia como benefícios. “Um condomínio é muito diferente de um hipermercado. Além disso, seria uma garantia de preservação do bosque, a ser mantido pela construtora. Pior é continuar como estacionamento”, diz.

“Há centenas de prédios vazios no entorno daquele terreno, cheio de apartamentos abandonados. Para que mais?”, questiona Célia.

Setin avalia que o projeto de Tozzi, arquiteto que assina obras como o Parque Villa-Lobos e o Fórum Trabalhista da Barra Funda, na zona oeste, tem potencial para atrair um novo público para a região. Segundo ele, será um condomínio de estilo contemporâneo. Uma das quatro torres será comercial.

O projeto prevê ainda o restauro da casa que fica no meio do bosque de 695 espécies de árvores, do muro e do antigo portão do colégio.