Com prolongamento da pandemia aumenta a procura da população por atendimento psicológico na rede municipal de Saúde

Psicóloga Valéria Chagas atua no SUS há 23 anos e diz que momento tem gerado medo e ansiedade em muitas pessoas

Além dos impactos na saúde física e na economia, a pandemia de Covid-19 também tem afetado emocional e mentalmente a população. Tanto que a Organização Mundial da Saúde (OMS) já alertou que os investimentos em serviços de saúde mental serão decisivos para a recuperação dos países pós-pandemia.

Pesquisa feita pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) em 33 países da América Latina e Caribe entre maio e junho do ano passado, sobre o consumo de bebida alcoólica durante a pandemia aponta, além do aumento da ingestão de álcool entre 42% das pessoas, que 52,8% dos entrevistados relataram aumento de ansiedade, medo, estresse e problemas para adormecer entre outros transtornos psicológicos. A psicóloga Valéria Pacheco Chagas, que atua há seis anos na Unidade Básica de Saúde (UBS) Vila Nivi, no bairro do Tucuruvi (Zona Norte), percebeu na prática o aumento desses problemas entre seus pacientes.

Na impossibilidade de dar continuidade aos atendimentos em grupo que vinham sendo retomados gradativamente com os devidos protocolos sanitários, a profissional teve um aumento expressivo na demanda por teleatendimento. Como a maioria dos pacientes tem seu número de celular, conta que recebeu muitas ligações, especialmente no início da pandemia. “De forma geral, as pessoas ficaram mais ansiosas, temerosas. Muitas demonstravam medo de contaminação pelo novo coronavírus, outras ficaram desestruturadas pelo distanciamento social imposto pela pandemia e outras ficaram mais depressivas. É uma situação que tem abalado muita gente”, explica.

Para a profissional, que atua no Sistema Único de Saúde (SUS) há 23 anos, os serviços públicos de psicologia ganharam ainda mais relevância com a pandemia. “Mais do que nunca as pessoas precisam cuidar de sua saúde mental, precisam ter acesso a tratamento na rede pública, pois, ao contrário da visão elitista que muita gente tem, psicoterapia é para todos”, afirma ela, que se interessou pela psicologia aos 14 anos de idade ao encontrar um livro sobre profissões em cima do guarda-roupa da casa dos pais. “Me encantou a possibilidade de contribuir para o bem-estar das pessoas, de auxiliá-las a se conhecerem melhor, a lidar com as questões que a vida nos traz”, disse.

 

Histórias marcantes

Entre as histórias marcantes que a motivam a seguir na profissão, relembra a de uma jovem que foi sua paciente no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Jaçanã, onde trabalhou por dez anos. “Era uma garota de 20 e poucos anos, que chegou por tentativa de suicídio. Ela vivia em uma família com muitos problemas e depois que seu cachorrinho morreu atropelado, não queria mais viver. Depois de muito tempo de tratamento, teve alta, conseguiu se recuperar totalmente e encontrar o sentido da vida de novo. Ainda nos falamos de vez em quando. Hoje ela mora em Natal, está casada, tem dois filhos e diz que está feliz. Isso para mim significa muito no trabalho, conseguir ajudar alguém a conquistar a felicidade”, conta.

Após concluir a graduação na cidade de Assis, Valéria deu início à carreira em 1992, como educadora no Programa SOS Criança da Secretaria Municipal do Menor em São Paulo. De lá, foi prestar atendimento no Hospital Psiquiátrico Pinel e no Hospital Psiquiátrico Água Funda e desde 1998, após ser aprovada em um concurso do Governo do Estado de São Paulo, atua como funcionária municipalizada na rede municipal de saúde de São Paulo. Antes da UBS Vila Nivi, onde está desde 2015, trabalhou no Caps Jaçanã e no Caps Álcool e Drogas Santana.

“As pessoas têm uma visão de que os casos tratados no Caps são muito mais complicados e o trabalho é maior, mas isso não é verdade. No Caps a gente tem uma equipe grande focada em cada caso, para ajudar de todas as maneiras que o paciente precisar. Já na UBS o trabalho é muito mais individual, mas como eu venho de outras experiências, mesmo trabalhando na UBS Vila Nivi, consigo fazer alguns trabalhos em conjunto”, diz.

Além de atendimentos individuais e em grupo, alguns feitos em parceria com o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (Nasf), Valéria também faz visitas domiciliares junto com a assistente social da unidade. Em parceria com a equipe de Estratégia de Saúde da Família, ela criou vários grupos regulares de atendimento. Um deles, chamado “Mente e Corpo”, tinha, antes da pandemia, 20 participantes e toda semana recebia um convidado para falar com os pacientes. A expectativa é retomar as reuniões com o mesmo número de participantes após o fim da pandemia.

Essa paixão pelo trabalho inspira Sofia, sua filha, que tem 19 anos e atualmente cursa o segundo ano de psicologia. “Ela queria fazer medicina veterinária no começo. Um dia, veio até mim e disse que teve uma intuição de que a psicologia era o caminho certo”, conta Valéria, que em seu tempo livre gosta de se reunir em casa com amigos e a filha, além de explorar a vasta gastronomia da capital paulista, indo a restaurantes diferentes.

Conhece alguém que necessita desse tipo de atendimento? Acesse http://buscasaude.prefeitura.sp.gov.br/ e saiba qual a unidade de Saúde mais próxima.