Casarão histórico em SP vira depósito de entulho

Fonte: Folha de S. Paulo

Terreno ao redor virou estacionamento e dono do imóvel na Bela Vista poderá ser multado

Imóvel foi tombado por representar um significativo exemplar da arquitetura paulista nas primeiras décadas do século passado

AFRA BALAZINA
DA REPORTAGEM LOCAL

Infiltração, paredes manchadas e rachadas, janelas e portas com diversos vidros quebrados e, o mais grave, parte do telhado começa a cair. Esta é a atual situação de um casarão na Bela Vista (região central de São Paulo) que foi tombado pelo Conpresp (Conselho Municipal do Patrimônio Histórico) em 2005 por representar um significativo exemplar da arquitetura residencial na capital paulista nas primeiras décadas do século passado.
O imóvel, localizado na rua Cincinato Braga, possui belos vitrais, tem banheiro decorado com mármore rosa e piso de tacos trabalhados. Entretanto nada dessa beleza pode ser vista, já que o casarão está fechado e sem uso. O terreno ao seu redor é usado para estacionamento. A varanda da casa virou um depósito de móveis quebrados, como cadeiras e mesas, e as paredes externas estão pretas de sujeira. Uma porta de metal na lateral da casa está toda enferrujada. A garagem guarda grandes pedaços de madeira.
O DPH (Departamento do Patrimônio Histórico da Prefeitura de São Paulo) diz que vai orientar ao Conpresp a aplicação de uma multa ao proprietário do imóvel. O valor ainda não foi definido. A subprefeitura da região também pode fazer uma autuação pelo fato de a casa estar mal conservada e representar perigo aos carros e pessoas que freqüentam o terreno.
Os funcionários do estacionamento afirmam que não entram no casarão, apenas utilizam um banheiro nos fundos. Eles não quiseram conversar com a reportagem.
"Na primeira vez que visitamos o casarão ele ainda estava intacto, belíssimo. Na segunda, já notamos infiltrações. Queriam construir um prédio no terreno e tentamos dialogar, encontrar uma solução para fazer o edifício sem descaracterizar o imóvel, mas acabaram desistindo da idéia e não nos procuraram mais", afirmou Mirthes Baffi, diretora da divisão de preservação do DPH.
De acordo com ela, o tombamento do casarão foi um pedido de moradores do bairro, que fizeram abaixo-assinados. "É preciso o envolvimento da comunidade novamente para reverter a situação", afirmou ela.
O corretor de imóveis aposentado Marcio Guedes Pereira lamenta a situação. "Sou morador da região desde 1956. A casa era uma jóia, superbem conservada. Pertencia a um casal de importadores de vinho. Mas, agora, estão só esperando que ela tombe, literalmente", disse.
Na opinião do advogado Gustavo Viseu, que atua em questões de patrimônio histórico e ambiental, deveria haver maior fiscalização do poder público para evitar a degradação dos bens tombados.
Mirthes Baffi alega que o DPH e o Conpresp não possuem fiscais para atuar e que dependem de denúncias da população para agir.
O advogado ressalta ainda que a administração municipal, ao constatar o mau uso e o descaso do proprietário, poderia desapropriar o imóvel.
"A responsabilidade pelo cuidado e preservação do imóvel é do proprietário, que pode ser multado se não fizer a sua parte. Porém, se o problema persistir, o próprio município poderia desapropriar o imóvel."
Além do casarão, a vegetação na frente e na lateral do imóvel precisam ser preservadas. Para o Conpresp, o conjunto "residência-vegetação tem grande valor na paisagem local, sobretudo pela grande verticalização existente nas imediações da avenida Paulista".
Apesar disso, assim como a casa, as árvores estão maltratadas. Há luzes penduradas em troncos, entulho e lixo jogado em meio à vegetação, principalmente nos fundos do lote.
A Folha tentou ouvir a empresa RCN, administradora do estacionamento, mas não obteve resposta. A empresa não esclareceu se apenas aluga o terreno ou se é dona do imóvel.