43% dos vereadores receberam doações do setor imobiliário

Fonte: Folha de S. Paulo

 

Câmara realiza hoje a última votação de projeto que amplia poder dos parlamentares no tombamento de imóveis históricos

Pela proposta, alterações nos entornos terão de passar pela Casa; mercado reclama que regras atuais restringem novos empreendimentos

AFRA BALAZINA
EVANDRO SPINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

A Câmara Municipal realiza hoje a segunda e última votação do projeto de lei que amplia o poder dos próprios vereadores no tombamento de prédios históricos e no seu entorno.
O texto amplia a participação de parlamentares no Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo). Estabelece ainda que decisões do conselho sobre o congelamento imobiliário do entorno de bens tombados terão de ser referendadas pela Câmara, medida que agrada o mercado imobiliário.
Levantamento feito pela Folha revela que, dos 55 vereadores que avaliam hoje o projeto, 24 (ou 43,64%) receberam, na última eleição, doações de empresas ligadas ao setor.
Os parlamentares que lideram o ranking dessas doações são Claudete Alves (PT) -R$ 115 mil-, José Américo (PT), Antonio Goulart (PMDB) -R$ 100 mil cada um- e Toninho Paiva (PMDB) -R$ 89.430.
Paiva é o representante da Câmara no Conpresp. Foi nomeado na semana passada em substituição a Juscelino Gadelha (PSDB), que recebeu R$ 15 mil de uma empresa da área.
O levantamento das doações foi feito a partir das prestações de contas entregues pelos vereadores à Justiça Eleitoral. A Folha incluiu empresas que atuam nas áreas de construção, incorporação, venda, administração e locação de imóveis.
Para Claudio Weber Abramo, diretor-executivo da Transparência Brasil, o grande volume de doações do setor para os vereadores exige que a sociedade fique "de antenas ligadas para saber se eles não vão beneficiar seus financiadores".
José Antonio (PT), que recebeu R$ 20 mil da Associação Imobiliária Brasileira, disse que as doações de campanha não refletem necessariamente a atuação dos vereadores.
"Não quero saber dos interesses do mercado imobiliário. Não sou representante do setor na Câmara. Até há vereadores que são, eu acho legítimo", afirmou o petista, presidente de uma comissão de estudos criada na semana passada para analisar as ações do Conpresp.

Mudança
Atualmente, os nove membros do Conpresp decidem se o bem será tombado e estabelecem as regras para sua preservação, inclusive limites para construções ao redor. Empresas do mercado imobiliário reclamam que as normas para os entornos desses bens prejudicam o setor, pois restringem novos empreendimentos.
A primeira versão do texto em análise na Câmara ampliava para 14 o número de membros do Conpresp, sendo seis vereadores, e exigia que todas as deliberações só fossem tomadas com, no mínimo, dois terços dos membros. Ou seja, as decisões dependeriam da concordância dos parlamentares.
O projeto causou reação, e os vereadores recuaram. O substitutivo que será votado hoje é menos "agressivo", mas também reduz o poder do conselho.
Pelo projeto, a Câmara passará a ter dois representantes e o conselho continuará com poder para definir sobre os tombamentos. Porém, todas as mudanças referentes aos entornos dos bens tombados precisarão ser aprovadas por, no mínimo, 37 vereadores.
"Não é correto que cinco conselheiros possam alterar o zoneamento da cidade. Eles podem deixar gente mais rica ou mais pobre da noite para o dia", disse José Antonio. "Não estou dizendo que os conselheiros são desonestos, mas é preciso colocar travas jurídicas para evitar problemas futuros."