Conheça melhor o Crematório Municipal de São Paulo

Atualmente, o Serviço Funerário Municipal tem registrado cerca de 740 cremações de corpos por mês; entenda melhor como é feito o processo de cremação

Há quem pense que a cremação reforce a incômoda sensação de finitude da nossa condição humana, por não exigir a necessidade marcos, como túmulos, que indiquem um local específico no qual foi sepultado um ente falecido. No entanto, ao conhecer o Crematório Municipal da cidade de São Paulo, seus entornos ajardinados e as instalações para a cremação de corpos, podemos perceber quantos mitos nos afastam da relação entre vida, morte e continuidade da memória.

A respeito dessa mistificação, a administradora do Crematório Municipal, Filomena Luiza Falcone Alcântara, comenta ser comum muitos visitantes irem ao local para saber mais sobre o procedimento da cremação. “Acho importante mostrar para todos como funciona, para tirar os medos e as impressões erradas sobre todo o processo”, explica. “Meu pai foi cremado aqui e eu também, quando me for, quero ser cremada”, complementa.

Fundado em 1974, o Crematório Municipal de São Paulo fica localizado no Jardim Avelino, na Zona Leste. Após a década de 1980 recebeu o nome “Dr. Jayme Augusto Lopes”, que era o diretor administrativo do Serviço Funerário do Município de São Paulo, na época de sua inauguração. O crematório fica ao lado do Cemitério São Pedro, do Parque Ecológico “Profa. Lydia Natalízia Diogo”, além de outros locais, como o heliponto, o Senai e o Hospital Estadual Henrique Altimeyer. E, apesar de se localizar no Jardim Avelino, acabou por ser popularmente conhecido por “Crematório Vila Alpina”.

Entrada do Crematório Municipal de São Paulo

No início, contava somente com dois fornos ingleses que funcionavam a óleo. E embora a demanda pelos serviços de cremação fosse baixa, a tecnologia utilizada para seu funcionamento acabava por emitir fumaça com muitos poluentes. Hoje, a realidade é bastante diferente: o crematório possui 4 fornos de alta tecnologia e, desde janeiro de 2016, foi realizada a troca do Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) por Gás Natural (GN), mais eficiente na combustão e menos poluente.

Com uma experiência de 30 anos de trabalho, o servidor do SFMSP, Alabá José de Paula, 62 anos, relata como a troca do GLP por GN melhorou o serviço. “Agora a gente não fica mais em contato com aquela fumaça preta, mesmo trabalhando diretamente com os fornos”, conta. Recentemente, servidores estratégicos dos setores de áreas verdes, manutenção e administração do crematório também receberam treinamento em brigada de incêndio e foi feita uma adequação no sistema de combate ao incêndio.

Ao longo os anos, a procura pela cremação tem aumentado consideravelmente. Entre os motivos, está o fato de a cremação ter normalmente um custo menor do que o sepultamento, visto que não há custos posteriores com manutenção dos jazigos, como acontece com as famílias que têm concessão de túmulos, e futuras exumações.

Só em 2015, foram realizadas 9.724 cremações de corpos e 2.214 cremações de ossos de despojos resultantes de exumações. Por isto, desde março de 2016, o SFMSP passou a oferecer aos munícipes seus serviços 24h, durante os sete dias da semana. A prioridade do local é dar atenção àqueles que, em uma situação delicada, já passaram por todo o processo do velório e já fizeram todos os trâmites para a realização das homenagens.

Atualmente, o Serviço Funerário Municipal tem registrado cerca de 740 cremações de corpos por mês, o que dá uma média de 24,6 cremações por dia. Também são feitas outras 124 cremações de ossos por mês, em média.

Da terra ao pó

Em tempos passados, era comum dizer que o processo de cremação começava em vida. Não há motivos para sustos: o cidadão devia ir direto ao cartório e deixar atestada uma declaração de vontade sobre seu desejo pelo serviço. Porém essa prática mudou. Filomena Falcone, administradora do Crematório Municipal, explica que basta a manifestação verbal de um parente de primeiro grau para que a cerimônia possa ser realizada, de modo que se evite maiores processos burocráticos diante de uma situação tão delicada.

Depois, segue-se o cronograma habitual. Primeiro, após o velório (que ocorre em outro local), é feita a remoção do corpo pelo transporte do Serviço Funerário Municipal até o Crematório Vila Alpina. Lá, as urnas são identificadas com os nomes dos respectivos falecidos e é emitida uma senha para os familiares, que depois serão atendidos via interfone, informando-lhes para se dirigir à sala ecumênica. O corpo, ao ser disposto no ascensor nos pavimentos inferiores, é elevado para esta sala, na qual os familiares podem realizar uma cerimônia de despedida, que geralmente leva, por volta, de 15 minutos.

Após esse procedimento, a urna é descida novamente ao pavimento inferior do prédio, local em que se localizam as câmaras frias e os fornos. Antes da cremação, deve-se esperar por 24 horas. Nesse período, a família ou a polícia podem requisitar o corpo de volta, caso a morte seja por causa violenta. Há também fatores religiosos que envolvem esse procedimento. Um exemplo são algumas correntes religiosas que têm a crença de que o espírito leva cerca de 72 horas para deixar o corpo, por isto, são feitos procedimentos diferentes para esses casos. O mesmo ocorre com os seguidores da Ordem Rosa Cruz, que exigem uma espera de 84 horas antes de se realizar a cremação.

Depois desse período, o corpo é colocado em um forno a 1.000°C, às vezes chega-se a 1.200°C, uma temperatura que irá volatizar a maior parte dos materiais ali contidos, inclusive as vestimentas e o caixão. Um corpo de 70 a 80 kg, em média, é reduzido a 2kg de cinzas em duas horas.

Sobre a entrega das cinzas

As cinzas são postas em sacos apropriados, de gramatura específica, com identificação do falecido, e colocadas dentro de outra sacola, de cor branca (de papel offset), para que as famílias possam dar o destino que desejarem. Em seguida, são levadas para uma sala onde ficam dispostas para a retirada dos familiares, de modo que todas estejam organizadas por ordem alfabética. O tempo para a retirada é de aproximadamente dez dias.

As urnas são obrigatórias?

As urnas são oferecidas aos munícipes como elemento opcional, pois não há um padrão ou urnas específicas para cinzas; elas são recipientes cobertos por uma tampa, decoradas ou simples, de diferentes materiais e de diferentes formas.

Além disso, a maioria das pessoas prefere não comprar ou levar uma urna, e sim aspergir as cinzas de seu ente querido nos próprios jardins do Crematório Municipal, que possui 138.700 m² de áreas verdes.

O crematório: concepção estética

O projeto do Crematório Municipal é de autoria de uma funcionária do antigo Departamento de Cemitérios da Prefeitura de São Paulo, o qual foi posteriormente assimilado pelo Serviço Funerário Municipal. A arquiteta Ivone Macedo Arantes, funcionária na época, é quem assina o projeto modernista das instalações do edifício.

A inspiração da escola brutalista paulista se dá em virtude da construção que valoriza os veios do concreto aparente e os chamados vãos livres, como o MASP. Também foi pensado, dentro do projeto, que ali se constituísse um espaço democrático, com árvores e jardins sem identificação para o esparzimento de cinzas, constituindo, semelhante ao Cemitério Père-Lachaise, em Paris, verdadeiros Jardins de Memória, nos quais os familiares depositam as cinzas no entorno de árvores, compartilhando de um mesmo espaço com demais homenagens de diferentes pessoas que por ali cumprem conjuntamente e de forma cidadã os ritos funerários.