A história de José Carlos, o China, se entrelaça com a do SAMU

Atualmente em função administrativa, China atua no SAMU desde antes da criação do serviço, em 1992

Na foto, o condutor José Carlos, o China, está dentro de uma ambulância, usando um uniforme do SAMU e com as mãos no volante

Hoje em função administrativa, China diz sentir saudade do tempo em que atuava no socorro direto às vítimas (Foto: Edson Hatakeyama)

 

José Carlos de Brito Farias nasceu há 72 anos em União dos Palmares, em Alagoas, mas há 35 anos, desde que começou a trabalhar na administração municipal paulistana, foi “rebatizado” de China. Hoje mais conhecido como “China do SAMU”, se orgulha do caminho que escolheu trilhar. Seu pai alagoano trabalhava na construção de vias férreas em Pernambuco, onde conheceu sua mãe, pernambucana e filha de indígenas. O casal constituiu família na cidade de União dos Palmares, em Alagoas, e teve seis filhos. Em 1965 mudaram para São Paulo, após a filha primogênita se estabelecer na capital, a 2.487 km de distância da cidade natal.

Residente da zona oeste, no bairro do Butantã, o jovem José Carlos trabalhava como auxiliar administrativo em um grande banco e como taxista, ofício que mudou sua direção profissional. Durante uma corrida para a Prefeitura de São Paulo, em conversa com uma passageira, soube da abertura de uma vaga na administração municipal para o cargo de motorista.

Munido de confiança e coragem, voltou no dia seguinte ao gabinete do então prefeito oferecendo seus serviços para início imediato em qualquer posto de trabalho disponível. Mesmo sem a garantia de colocação, foi encaminhado para a Regional Butantã, hoje equivalente à subprefeitura local, onde foi contratado como motorista do administrador regional. Foi durante os primeiros dias de trabalho na Regional que recebeu o apelido de China, dado pelo chefe do tráfego e adotado pelos colegas em razão de seus olhos levemente puxados, herança dos ancestrais indígenas. Hoje até alguns familiares o chamam dessa forma.

Trabalhou na então Regional Butantã e foi admitido pela gestão municipal em 1985, quando atuou na área correspondente à Vigilância Sanitária. Em 1989, por meio de concurso público, iniciou suas atividades em ocorrências de atendimento pré-hospitalar (APH) na Central de Comunicações (Cecom), que hoje é o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).

China atua no SAMU desde antes da criação do serviço, em 1992. Participou de centenas de ocorrências em sua carreira e, segundo ele, algumas delas muito marcantes, como a do atendimento a um senhor em situação de rua acompanhado de um cachorro. O servidor conta que após prestarem o primeiro atendimento ao homem, que não queria deixar seu animal de estimação desamparado, se predispôs a garantir que alguém levasse o cão até o hospital onde o paciente seria internado para tranquilizá-lo. E cumpriu sua promessa. O cachorro ficou sob os cuidados da equipe de vigilância da unidade hospitalar durante o período de internação do paciente. “Uns 15 dias depois de receber alta, esse senhor me reencontrou na mesma praça onde o havíamos socorrido, me reconheceu e me agradeceu bastante pelo cuidado que tivemos com ele e seu bichinho”, relembra. “São esses momentos que fazem tudo valer a pena, eu gosto muito do meu trabalho”, diz.

China conta que descobriu sua aptidão depois de presenciar o incêndio no edifício Andraus, em 1972, na região da República, centro de São Paulo. Ao acompanhar o trabalho dos bombeiros e policiais no acidente que matou 16 pessoas, o jovem que tinha 23 anos se ofereceu para ajudar no salvamento das vítimas, mas para sua própria segurança foi impedido pelos profissionais que combatiam as chamas.

O condutor afirma que foi no serviço público que encontrou seu propósito. Desde 1997 exerce função administrativa, mas diz sentir saudade da época em que realizava atendimentos diretamente às vítimas. Ressalta que tem o SAMU como parte de sua família e que nada o desmotiva. “Adoro trabalhar nesta função de servir. Salvar vidas foi o melhor reconhecimento por meu trabalho, me sinto feliz em fazer o bem.” Se ele pensa em se aposentar? Não tão cedo. “Quero continuar trabalhando.”