São Paulo e Amsterdã firmam pacto de cooperação em oito temáticas

Pacto inclui política para dependentes químicos. Neste mês, missão de secretários municipais apresentou o programa “De Braços Abertos” em Amsterdã e conheceu melhor a política de drogas holandesa

 As prefeituras de São Paulo e Amsterdã, capital da Holanda, assinaram um Memorando de Entendimento entre as duas cidades. O documento prevê cooperação em oito temáticas: reintegração social de usuários de drogas e moradores de rua, governo eletrônico, mobilidade urbana, desenvolvimento urbano sustentável, políticas LGBT, educação e esportes, cultura e indústria criativa, marketing de cidades.

O prefeito Fernando Haddad recebeu nesta quarta-feira (26) Kees Rade, Embaixador da Holanda no Brasil, e Jan Gijs Schouten, Cônsul-Geral da Holanda em São Paulo. Em reunião na sede da Prefeitura, Haddad conversou sobre a recepção dos torcedores holandeses durante a Copa do Mundo. O encontro também discutiu oportunidades de cooperação entre as cidades nas áreas de mobilidade urbana e de tratamentos para dependentes químicos.

Em fevereiro, um grupo formado por secretários municipais foi a Amsterdã para conhecer a experiência da cidade em política de redução de danos, especialmente na construção de uma rede de acolhimento para usuários de drogas e pessoas em situação de rua. O grupo fez reuniões com membros do Ministério da Saúde, Bem-Estar e Esportes e da ONG The Rainbow Group – focada no acolhimento e tratamento de usuários de drogas e populações vulneráveis.

“Eles têm desde 1976 na Holanda cerca de 5 mil atendidos no caso específico da heroína, que foi uma epidemia nos anos 70 e foi totalmente controlada. Eles conseguiram a redução de uso, um uso mais seguro, com substituição da heroína injetável, e a campanha foi efetiva para que novas gerações não usassem a droga”, explicou o secretário municipal de Relações Internacionais, Leonardo Barchini.

Os bons resultados da iniciativa holandesa, segundo a secretária municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Luciana Temer, estão na construção de um elo sólido entre poder público e dependentes químicos. “Nós verificamos que estamos no caminho certo, que estamos em São Paulo no início de um processo de formação de vínculo entre dependente e Estado”, avaliou a secretária.

Outro diferencial foi um cuidado com o impacto urbano da dependência química. “Uma questão importante em relação à política holandesa é que existe uma dupla preocupação: com o usuário, com a vida, com suas condições básicas, e tem uma preocupação social também, o de acabar com o uso na rua, de diminuir o índice de criminalidade, de furto e roubo”, observou Luciana Temer.

Amsterdã


A delegação foi recepcionada em Amsterdã pelo vice-prefeito Eric Van der Burg. Na ocasião, Van Der Burg ressaltou o interesse de Amsterdã em aprender mais com São Paulo e ficou impressionado com os números do programa “De Braços Abertos”, que já conseguiu reduzir em até 70% o consumo diário de crack. “Cada cidade tem que buscar soluções específicas para estas situações. Nossa política teve um sucesso importante em diminuir o impacto das drogas tratando isto como um problema de saúde e também social, e não só policial, além de fazer uma distinção entre drogas leve e drogas pesadas”, disse Kees Rade, Embaixador da Holanda no Brasil.

Para o secretário Roberto Porto (Segurança Urbana), a política de redução de danos é importante para o sucesso do combate ao tráfico. “A política é interessante do ponto de vista de que coíbe o uso na rua, dando uma alternativa viável e segura do ponto de vista da saúde. Eles fazem uma distinção com muito sucesso entre o usuário e o traficante. Eles conseguiram separar muito bem os dois focos: um recebe assistência e o outro é alvo de atividade policial”, afirmou Porto

Além de Leonardo Barchini, Luciana Temer e Roberto Porto, participaram da missão na Holanda o secretário municipal Rogério Sottili (Direitos Humanos). A pasta da Saúde estava representada por Myres Cavalcante, coordenadora para Saúde Mental.

Política holandesa


Associando rede de segurança social e coibição do tráfico de drogas, a Holanda conseguiu implantar políticas de prevenção e redução de danos bem-sucedidas. As ações foram colocadas em prática nos anos 70. Em 1976, foram instauradas medidas de tolerância às drogas, a separação do mercado e a distinção entre substâncias leves e pesadas.

No país, o número de dependentes químicos em 2011 estava estimado em 30.000 pessoas, ou 0.3% da população. A Holanda conta com 13 organizações especializadas para o tratamento de dependentes, segundo dados do Departamento de Nutrição, Proteção à Saúde e Prevenção.

Desde o fim da década de 70, dependentes de heroína recebem tratamento de 3 anos com o uso acompanhado de metadona, opióide sintético utilizado como moderador de crises de abstinência; uso da droga na versão medicinal – implantada nos anos 80-, e troca de agulhas com o intuito de evitar a proliferação de doenças sexualmente transmissíveis.

No campo social, são medidas importantes a oferta de ocupação diária e abrigos destinados à população vulnerável (em 2003, foram criados abrigos especializados).

O sucesso das políticas de prevenção e redução de danos pode ser verificado na evolução das faixas etárias incluídas no tratamento com metadona entre 1975-2012, em Amsterdã. No ano de 1975, < 25 até 34 anos eram a faixa mais atendida no tratamento com metadona, contabilizando 80% dos casos. Nos anos 2010, os jovens não chegavam a 10% dos pacientes. Pessoas de meia-idade, entre 45 e 55+, passaram a ser os mais atendidos (em torno de 70%).

No ano de 2012, 2.000 pacientes estavam em tratamento com metadona na cidade de Amsterdã, segundo dados do Serviço Público de Saúde da cidade.