Deu na Imprensa - A metrópole tenta ser verde

Agência de Notícias Brasil - Árabe - 14/07/2009

São Paulo gera energia em dois dos seus aterros sanitários. Em vez de destruir a camada de ozônio e levar mau cheiro para os moradores, os gases gerados pelo lixo viram luz e créditos de carbono.

São Paulo – A comerciária Lizete Araújo da Silva, 51 anos, trabalha há cerca de dez anos numa loja de artigos variados em Perus, um dos bairros mais afastados da cidade de São Paulo. Ela vem da cidade vizinha de Franco da Rocha e desde 2003 o ar com o qual se depara quando desembarca do ônibus, em Perus, está melhor para respirar. O motivo é que ali por perto, grandes quantidades de metano e gás carbônico deixaram de ser emitidas no ar e ganharam um fim mais nobre: passaram a gerar energia.

No bairro de Perus funciona um dos projetos paulistanos de geração de energia a partir do lixo. O local não foi escolhido ao acaso. Ali havia um aterro, chamado Bandeirantes, em atividade. Hoje o aterro não recebe mais lixo, mas o material que foi depositado no local por cerca de trinta anos, agora em decomposição, solta o gás necessário para a produção de energia elétrica. Antes ia para os pulmões de Lizete, e outros Joãos e Marias que por ali vivem, tornando o ar dos mais vizinhos até mesmo de mau cheiro, e colaborava para destruir a camada de ozônio.

Além do Bandeirantes, São Paulo também gera energia com o lixo em outro aterro, o São João, no bairro de São Mateus. Juntos eles fizeram com que a Prefeitura Municipal de São Paulo, que está à frente dos projetos, reduzisse 20% das suas emissões de gases prejudiciais ao meio ambiente. E também ganhasse dinheiro. A iniciativa rende créditos de carbono que já foram negociados em dois leilões, em 2007 e 2008, gerando R$ 71 milhões. A verba é usada em projetos para as comunidades que vivem ao redor dos aterros.

O aterro Bandeirantes é o maior em resíduo domiciliar da América Latina, com 1,4 milhão de metros quadrados, e pelas tubulações da sua usina de energia passam, de acordo com informações da Biogás, empresa responsável pela geração da energia, 150 mil Nm3 (Normal Metro Cúbico) em gás por dia. Junto com o São João, cuja usina também é de responsabilidade da Biogás, o projeto responde por 59% dos créditos de carbono negociados no mundo a partir de geração de energia do lixo.

A Biogás assumiu o aterro Bandeirantes em 2003 e o São João em 2006. Os créditos de carbono obtidos são, metade da Prefeitura e metade da Biogás. Já a energia elétrica é toda da Biogás. Por um acerto inicial da Biogás com o banco Unibanco, a energia elétrica – 20 megawatts por hora – é utilizada para as agências da instituição financeira. Na verdade, o que o banco faz, explica Antonio Carlos Delbin, diretor técnico da Biogás, é jogar a energia na rede da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em troca das suas contas de luz.

Delbin conta que já foram capturados quatro milhões e meio em créditos de carbono. Aparentemente, é tudo muito simples. São postos tubos de sucção, no aterro, pelos quais o gás vai até a usina, onde funciona como um motor para a geração de energia. Mas exige investimento que nem sempre é rentável. Tanto que a Prefeitura de São Paulo fez projetos de geração de energia para quatro aterros. Apenas dois tiveram propostas de empresas interessadas em levar as usinas adiante.

Se o aterro está muito longe da rede de energia, explica Delbin, não vale a pena o investimento na transmissão. No aterro Bandeirantes, por exemplo, a Biogás investiu entre R$ 3 a R$ 4 milhões para isso. No São João foram R$ 30 milhões. O custo benefício é apontado como uma das causas para que existem poucas iniciativas de geração de energia a partir do lixo no país. O diretor técnico explica que é preciso avaliar, em cada projeto, se vale a pena a exploração de crédito de carbono e a geração de energia elétrica.

Sem aterro

Esse tipo de projeto, na verdade, é criticado por parte dos ambientalistas e profissionais da área de energia. O doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), Sabetai Calderoni, que tem estudos mundialmente conhecidos na área de meio ambiente, acredita que essa não é a melhor solução para o lixo, já que o ideal é que não sejam feitos aterros. Calderoni afima que para os aterros que já existem, porém, é uma boa medida. “O metano é vinte vezes mais poluente que o gás carbônico”, diz o doutor.

Na opinião de Calderoni o ideal seria fazer uma coleta seletiva. Depois dela, os materiais que não podem ser reutilizados e têm poder calorífico, como entulho de construção, madeira, podem ser postos em um equipamento de gaseificação para então gerarem energia. Diferente do aterro, que tem uma vida útil em geração de energia curta – ele pode gerar energia por 15 a 20 anos após parar de receber lixo – este outro tipo de iniciativa pode ser permanente, o que a torna também economicamente mais interessante.

Com aterro e fama

Enquanto projetos assim não são realidade, porém, gerar luz e crédito de carbono do lixo é uma das iniciativa aplaudidas mundo afora na área de meio ambiente. O município de São Paulo ganhou destaque internacional em função dos seus aterros-fábricas de energia. Os projetos foram apresentados no encontro do C-40, grupo formado pelas maiores cidades do mundo para encontrar formas de dar mais sustentabilidade ao planeta, que ocorreu em Seul, em maio. A atuação ambiental deu a São Paulo a possibilidade de sediar, em 2011, o C-40.

“As cidades e aglomerados urbanos respondem por 75% das emissões de gás carbônico”, diz o secretário-adjunto de Relações Internacionais da Prefeitura de São Paulo, Flávio Goldman. Ele lembra, no entanto, que é pelas cidades também que passam as soluções dos problemas ambientais, com políticas de gestão urbana, gestão de resíduos, uso racional de energia e incentivo ao transporte coletivo, entre outras.

São Paulo, embalada por um prefeito (Gilberto Kassab) preocupado com a questão ambiental, implementou nos últimos anos uma série de ações na área, como o programa 100 Parques, que prevê que os atuais 58 parques do município chegam a 100 em 2012, o Projeto Solar, que torna obrigatória a instalação de sistema de aquecimento de água pela energia solar em novos edifícios, a inspeção veicular, que mede as emissões dos veículos, entre outros. A cidade também criou uma legislação municipal para o meio ambiente.

Fonte:  Agência de Notícias Brasil - Árabe - Isaura Daniel