Você sabe o que faz verdadeiramente um geógrafo?

Ilustração colorida em tons de salmão, lilás, marrom e branco, composta pelo desenho do globo terrestre. À direita, estão os dizeres: "Dia do Geógrafo".
O que vem à mente quando você pensa em um geógrafo? As aulas de geografia assistidas durante os anos escolares são, provavelmente, a primeira lembrança da maioria das pessoas, bem como alguns conteúdos comuns desta disciplina, como conceito de paisagem e estudo de mapas e tipos de relevos existentes no planeta. Contudo, a rotina vai além das salas de aula: atualmente, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) conta com 19 geógrafos que atuam em diferentes departamentos. Comemorado nesta quarta (29), o Dia do Geógrafo é uma ótima oportunidade para homenagear este profissional e conhecer o leque de possibilidades da carreira.

“De forma geral, o profissional da área da geografia é tido como professor, ou como alguém que trabalha com cartografia e geoprocessamento, ou seja, com mapeamento. Na verdade, é uma área muito mais extensa, que lida com relações geopolíticas, ambientais e territoriais; povos tradicionais; e estudos sobre o meio físico e biótico pela ótica da ocupação do planeta e a relação do homem com os bens naturais”, explica Helen Evelin de Souza, geógrafa e gestora do Parque Natural Municipal Fazenda do Carmo (PNMFC), Unidade de Conservação (UC) municipal que concentra o maior remanescente de Mata Atlântica existente na Zona Leste da capital.

A proteção e a conservação do Fazenda do Carmo são os principais objetivos das atividades realizadas no dia a dia de Helen, como interação com o entorno por meio da educação ambiental, monitoramento da vida silvestre e verificação de intervenções dentro da área ou na zona imediata do parque. “O melhor da profissão é poder ouvir, nortear e dialogar com a comunidade e pensar de forma coletiva sobre um problema local ou até global”, opina.

Comunicação é um ponto importante também para o geógrafo Jânio Marcos Rodrigues Ferreira, coordenador de Cartografia e Geoprocessamento da Divisão de Gestão de Unidades de Conservação (DGUC). “Uma das características desta profissão é a capacidade de dialogar e manter interface com outras áreas, sejam exatas, humanas ou biológicas. A formação deste profissional pressupõe que ele tenha conhecimento e habilidades em climatologia, solo, geomorfologia, cartografia e topografia, geoprocessamento, biogeografia, recursos hídricos e hidrografia, além da interface com as ciências humanas e sociais, como demografia e estudos de população”, esclarece.

Desafios

O geógrafo Maykon Ivan Palma trabalha há dez anos com licenças ambientais na SVMA. Ele cita o Artigo 225 da Constituição Federal – que garante a todos o “direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado” e dirige “ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” – ao avaliar a importância destes profissionais diante dos problemas ambientais. “Ao geógrafo pesquisador, cabe demonstrar através de estudos e artigos científicos as mudanças das paisagens geográficas ao longo das décadas. A partir disso, é possível guiar políticas públicas de gestão e planejamento a fim de garantir um direito constitucional”, justifica.

Supervisor do Grupo Técnico de Georreferenciamento (GTGEO) – setor responsável por mapear licenças, autorizações e termos expedidos pela Coordenação de Licenciamento Ambiental (CLA) –, Maykon vê de forma positiva a atuação do geógrafo na capital paulista. “A metrópole de São Paulo é muito dinâmica e, por isso, os órgãos públicos estão mais preparados a disponibilizar informações que facilitam a atividade do geógrafo. O município tem o portal eletrônico GeoSampa, enquanto o Estado tem o DataGeo, o Centro de Estudos da Metrópole (CEM), o Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo (IGC) e a Empresa Paulista de Planejamento de Metropolitano S.A (Emplasa), que facilitam muito a atuação na metrópole”, descreve.

A atuação do geógrafo também encontra conflitos diante de conceitos equivocados de progresso. “O meio ambiente é visto como vilão ao desenvolvimento dos bairros que ainda hoje possuem áreas verdes com grandes maciços de mata nativa”, explica Helen, gestora do PNMFC. “Uma das dificuldades desta profissão é ser sempre visto como profissional que anda na contramão do ‘desenvolvimento urbano’. A falta de valorização e o próprio entendimento da importância deste profissional para a sociedade como um todo também são, pois, de forma a contemplar, geógrafas e geógrafos trabalham o contexto histórico da ocupação da sociedade no território”, ressalta.

Para Jânio, a aplicação de conhecimentos variados e a integração com outros profissionais são ferramentas fundamentais para a atuação diante dos problemas ambientais em metrópoles como São Paulo. “Na maioria das vezes, os desafios colocados estão atrelados ao planejamento urbano e ambiental, sendo que o geógrafo geralmente é integrante de equipes multidisciplinares com arquitetos, engenheiros, agrônomos, geólogos e biólogos. Neste cenário, este profissional traz contribuições com o conhecimento das dinâmicas climáticas, da gestão de recursos hídricos e naturais, entre outros elementos socioambientais que compõem temas de meio ambiente e gestão ambiental pública”, relata.

O geógrafo André Luiz Andrade Pinto, que trabalha do Grupo Técnico de Áreas Contaminadas (GTAC) da SVMA, também considera a multidisciplinaridade e a união entre áreas do conhecimento – humanas, exatas e biológicas – como um meio de encontrar soluções e viabilizar o desenvolvimento sustentável. Fascinado por paisagens, por mapas e pela diversidade de relevos desde pequeno, ele considera que a geografia abrange aspectos distintos que nem sempre seriam abordados por outros campos. “Dadas essa vantagem, as contribuições futuras por parte dos geógrafos para o tratamento da crise ambiental são promissoras e espera-se que suas vozes sejam ouvidas não apenas por tomadores de decisões, mas também por pesquisadores de outros ramos. Isso resultaria em uma mudança de mentalidade que levaria à mudança nos processos produtivos e, finalmente, na qualidade de vida”, finaliza.

Dicas

Motivada ainda na adolescência por uma professora apaixonada pela profissão, Helen – que sempre gostou de estar em meio às florestas – encontrou na geografia uma oportunidade de estudar e proteger o meio ambiente. A quem quer seguir nesta carreira, ela aconselha: “Estudo, persistência e muito engajamento. A recompensa não será a valorização financeira, mas sim quando uma espécie ameaçada de fauna ou flora estiver em um ambiente protegido e pela compreensão da comunidade de que o ser humano também é orgânico e que o meio ambiente é parte de nós – ou melhor, nós somos parte dele. A realização vem dos projetos e ações que ficam para o território”.

Sempre interessado pelas áreas ligadas às tecnologias de mapeamento, como cartografia, geoprocessamento, uso de GPS e geotecnologias, Jânio está há 10 anos na SVMA e, atualmente, trabalha com elaboração de mapas, relatórios, plantas e levantamentos destinados à gestão de UCs. Aos futuros geógrafos, ele recomenda investimento em especializações e renovação constantes. “Há necessidade de estar sempre atualizado no campo de desenvolvimento tecnológico de softwares de mapeamento, equipamentos e novas tecnologias, como drones, VANTs (Veículos Aéreos Não-Tripulados), entre outros aspectos tecnológicos”, indica especialmente aos que desejam seguir nesta mesma área.

Abertura ao aprendizado permanente também é a dica de Maykon: “A carreira de geógrafo espera que o profissional esteja sempre atualizado e disposto a aprender assuntos diversos. Somente assim ele poderá responder às questões de entendimento da paisagem geográfica, já que esta paisagem é composta por interações dos meios econômicos-sociais, biológicos e físicos”.

Seja em gestão de UCs, mapeamentos, licenciamento ambiental ou análise de áreas contaminadas, André Luiz lembra as diferentes abordagens oferecidas pela área e as inúmeras maneiras de estudar e atuar na questão ambiental: “Muitas pessoas pensam que a Geografia estuda apenas mapas, relevos e vegetações, mas é muito mais que isso. Geógrafos estudam a relação do ser humano com o meio em que vive em diversas áreas: como a população lida com a saúde, com o lixo, ou com o deslocamento; e a distribuição espacial de espécies, as interações do homem com o meio”.