ARTIGO: O Déficit Habitacional e a invasão do edifício Prestes Maia

Publicado no dia 26/02/06 no Jornal Diário de São Paulo

A cidade de São Paulo abriga, em suas quase 3 milhões de habitações, perto de 10,5 milhões de pessoas. Dessas, 3,4 milhões residem em moradias precárias, 1,6 milhões em loteamentos clandestinos ou irregulares, 1,2 milhões em favelas e 600 mil em cortiços. Seria necessária a construção de 850 mil novas casas a um custo de R$ 34 bilhões para que todos morassem com dignidade. Esse valor corresponde a dois orçamentos da cidade – o que demonstra a imensa dificuldade para a solução do problema.
Somente com a soma dos recursos federais, estaduais e municipais será possível criar um verdadeiro plano habitacional para atender à população que habita de forma inadequada em palafitas, malocas, casebres, favelas, cortiços, enfim sub-habitações com falta de saneamento básico, transporte inadequado, infra-estrutura precária e outras carências. Aliado a isso é necessária a flexibilização da legislação urbanística, permitindo a regularização fundiária e a desburocratização da concessão de financiamentos para a reurbanização, reforma, construção e comercialização dos imóveis.
A atual administração tem atacado o problema, buscando parcerias com o governo do Estado. A CDHU (empresa de habitação do governo estadual), em convênio com a COHAB (a companhia municipal), tem permitido que a Prefeitura indique a demanda para as casas construídas com recursos do ICMS. Há também uma parceria com a Caixa Econômica Federal, na qual a indicação dos moradores é instruída com o cadastro municipal para os imóveis construídos pelo programa PAR – Programa de Arrendamento Residencial.
Nos programas de reurbanização a Prefeitura deu prioridade às favelas, sendo que 18 delas, inclusive na região dos mananciais, estão sendo dotadas de infra-estrutura e saneamento básico. As favelas Heliópolis e Paraisópolis têm prioridade nos programas de recuperação urbanística porque abrigam mais de 200 mil pessoas.
Os programas de mutirão foram reativados: 24 deles estão em construção, alguns iniciados há mais de uma década e paralisados por vários anos. A COHAB reativou no fiml do ano passado o novo sistema de inscrições e atualizações para o programa de habitações por meio da Internet. Em poucos meses já conta com 100 mil inscritos com cadastro atualizado.
A dificuldade em atender com rapidez a enorme demanda por casas na cidade de São Paulo tem se traduzido em entusiasmo para que a Administração Municipal trabalhe intensamente buscando soluções de curto prazo.
Tarefa difícil tem sido tentar ajudar quem não quer ser ajudado. Lamentável a atitude de algumas “lideranças” de sem teto, que agem de forma retrógrada, violenta, irresponsável, com fins eleitoreiros, praticando mercantilismo com pessoas debilitadas social e economicamente, sugando o pouco que têm, invadem propriedades públicas ou privadas levando essa população fragilizada a aventuras arriscadas. Nesses casos, crianças, idosos e deficientes acabam sendo os que mais sofrem.
É exemplar a situação do prédio invadido há 4 anos na Avenida Prestes Maia. Trata-se de uma propriedade particular que, segundo o autodenominado Movimento dos Sem-Teto do Centro (MSTC), abriga 468 famílias com 2 mil pessoas.
Na realidade, ali habitam, de forma inadequada, sem um mínimo de segurança, com higiene precária, 293 famílias e 138 solteiros, somando aproximadamente 1.100 pessoas (cadastro oficial realizado no final de 2005 pelas assistentes sociais da Subprefeitura Sé, organizado e autorizado pelas “lideranças” do MSTC, cuja cópia contendo as características das famílias e solteiros foi entregue ao Ministério Público Estadual interessado em resolver o problema).
Qual o objetivo das “lideranças” informarem sistematicamente à imprensa a presença de 468 famílias e 2 mil pessoas? Será que alguém irá usufruir ilicitamente (em nome das 900 pessoas declaradas a mais) do atendimento dos órgãos públicos quando da execução da ordem de reintegração de posse determinada judicialmente?
São freqüentes as “manifestações” por meio de passeatas na região central, causando transtornos a quem transita na cidade e desrespeitando aqueles que de forma ordeira e civilizada fazem suas inscrições nos programas públicos de atendimento habitacional.
Recentemente, os moradores foram insuflados pelas “lideranças” a interditar a Avenida Prestes Maia, o que foi feito, expondo as pessoas a risco de atropelamentos e podendo ocasionar acidentes, causando enorme congestionamento nas principais vias de acesso da região central com repercussão no trânsito de toda a cidade.
Prática comum tem sido o comportamento dessas “lideranças” que, após terem sido atendidas nas suas reivindicações, orientam seus associados ao não pagamento de prestações, condomínios, etc., criando inadimplência e deterioração do patrimônio.
A população da cidade de São Paulo que acorda cedo, trabalha, estuda, que quer melhorar de vida, pretende realizar o sonho de ter a sua casa própria, não tolerará ser passada pra trás por “lideranças” que incitam à invasão de propriedades alheias.

Orlando de Almeida Filho é Secretário Municipal de Habitação da Prefeitura de São Paulo