ESPALHA EDH - ENTREVISTA

Neste 13 de maio de 2020 são 132 anos da assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, ato que gerou a libertação de 700 mil escravos que ainda existiam no Brasil em 1888 e proibiu a escravidão no país. Mas o 13 de maio não é visto como uma data a ser comemorada pelo movimento negro, porque não trouxe consigo medidas, por parte do Estado Brasileiro, que minimizassem o impacto do fim da escravidão ao povo negro. Não adotou medidas de integração social e nem econômica, apenas abandonando essa imensa comunidade à própria sorte. Para falar um pouco sobre a data, o Espalha EDH convidou  a Secretária Executiva Adjunta de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da SMDHC, Elisa Lucas Rodrigues.

1) Para vocês da CPIR, qual a importância do 13 de maio?
R: O 13 de maio é uma data de reflexão sobre a escravização no Brasil. Se imaginarmos uma libertação em que não houve indenização (sem moradia, educação e demais direitos concedidos à população branca), houve um grande impacto para a população negra.

2) Qual foi o papel da Princesa Isabel para a abolição da escravidão? Como você avalia?
R: Como maior autoridade da monarquia e pelo contexto político, foi incumbido à Princesa Isabel o importante papel de assinar a Lei Áurea. Essa era uma reivindicação de muitas pessoas. A norma resumiu-se a dois dispositivos, quais sejam: “Art. 1º É declarada extinta desde a data desta Lei a escravidão no Brasil. Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário”. Ela poderia ser melhor, porém, como mencionamos, o texto não previu nenhuma espécie de indenização.

3) Alguns estudiosos, como o escritor, jornalista e diretor da Página 3 Pedagogia e Comunicação, Antônio Carlos Olivieri, consideram que a data tem seu valor histórico, pois "comemora a vitória do movimento abolicionista e do parlamento brasileiro", sendo "a campanha abolicionista, um dos maiores movimentos cívicos da história do Brasil, ao lado da campanha pelas Diretas Já". Como vocês veem o movimento abolicionista?
R: Vejo como uma articulação de pessoas sensíveis à situação da população negra.

4) Quais os principais atores do movimento abolicionista? Por que há um movimento de embranquecimento dos abolicionistas?
R: Do movimento abolicionista podemos mencionar Dandara dos Palmares, Zumbi dos Palmares, Luísa Mahin, Castro Alves, Joaquim Nabuco, Luiz Gama, José do Patrocínio, André Rebouças e Francisco José do Nascimento. Sobre o embranquecimento do movimento abolicionista, houve a participação de pessoas brancas sensíveis à questão, no entanto, também houve interesse de pessoas interessadas no fim da escravização como forma de se livrar de um “peso negro”.

5) Ante a ausência de medidas por parte do Estado Brasileiro, como foi o 14 de maio de 1888?
R: Passada a euforia do 13 de maio, acreditamos que o 14 de maio deve ter sido um dos dias mais tristes para a população negra. Sem teto, sem alimentação, sem emprego, sem nenhuma garantia e reconhecimento de contribuição para a formação da identidade nacional brasileira. Não fosse o trabalho das mulheres negras nas casas grandes com serviços domésticos, essas famílias negras passariam por mais dificuldades ainda.

6) O que o Estado Brasileiro e o município de São Paulo tem feito para corrigir a falta de oportunidades pós Lei Áurea?
R: O Brasil apresenta um conjunto de práticas chamadas ações afirmativas, tendo por finalidade corrigir parte da dívida histórica para com a comunidade negra. Essas ações são configuradas como cotas raciais no ensino superior e em concursos públicos federais, entre outras. O município de São Paulo tem ações marcantes nesse sentido, como as cotas raciais em concurso público, em cargos em comissão, postos de estágio profissional e em campanhas publicitárias. Temos a implementação do quesito raça/cor, conforme a regulamentação assinada pelo Prefeito Bruno Covas, determinando que toda coleta de dados do município contemple a previsão do pertencimento racial. Na saúde, ações como seminários sobre a saúde da população negra, com temas como diabetes e hipertensão, foram realizados para funcionários da Secretaria Municipal da Saúde. Temos outras ações na Prefeitura Municipal de São Paulo, como adesão ao Sistema Nacional de Promoção de Igualdade Racial (SINAPIR); assinatura do Plano Municipal de Promoção de Igualdade Racial (PLAMPIR); implantação dos Centros de Referência de Promoção de Igualdade Racial, com objetivo de acolhimento de denúncias de discriminação racial; controle participativo da política de cotas raciais para ingresso no funcionalismo público; eleições de Conselhos Municipais (Promoção da Igualdade Racial, Povos Indígenas e Comunidade Nordestina); apoio psicológico para vítimas de racismo e ações para fortalecimento de empreendedores(as) negros(as).

7) Você poderia fazer um paralelo entre o 13 de maio e o 20 de novembro? Qual a importância de cada data e o que ela traz como discussão para a sociedade em geral?
R: Do ponto de vista histórico, o 13 de maio é um marco importante por toda a articulação dos abolicionistas, enquanto o 20 de novembro resgata a nossa autoestima enquanto negros. A visibilidade de um herói, como Zumbi dos Palmares, exemplifica como somos capazes de lutar por nós mesmos. Em comum, as datas representam a resistência negra numa realidade estruturada no racismo. O Quilombo dos Palmares mostra nossa resistência e articulação para viver em sociedade, nosso inconformismo em relação à escravização. Zumbi e Dandara dos Palmares são referência como heróis para toda a sociedade. As escolas, os coletivos, órgãos e conselhos têm pautado essa discussão, mostrando que nunca houve passividade em relação ao sistema escravocrata.

8) Qual mensagem que a CPIR gostaria de deixar, em tempos de enfrentamento ao COVID-19, neste 13 de maio?
R: A CPIR lembra que, em tempos de COVID-19, nesse 13 de maio, a população negra está à frente do combate e da manutenção, com nossos/as enfermeiros/as, entregadores/as de alimentos, trabalhadores/as de supermercados, coletores/as de rua, entre outros serviços do chamado "campo essencial". Por isso, devemos refletir sobre como as vidas negras são expostas nos processos de sustentação da sociedade e sobre como devemos modificar tal realidade.