Exposição de Antonio Benetazzo devolve à cidade o acesso a sua obra artística

Com cerca de 90 obras, exposição fica em cartaz até o dia 29 de maio. Informamos que a exposição estará fechada para visitação entre os dias 12 e 22/4, em função da realização de serviços de melhoria no prédio do Centro Cultural São Paulo

A abertura na sexta-feira, no Centro Cultural São Paulo, da exposição “Antonio Benetazzo, permanências do sensível”, foi o ápice de um longo trabalho de pesquisa que agora revela ao público uma obra artística mantida no anonimato por mais de 40 anos. Realizada pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania (SMDHC), por meio da Coordenação de Direito à Memória e à Verdade, a exposição permite à sociedade conhecer o talento do militante Antonio Benetazzo, brutalmente assassinado pela ditadura em 1972.

“Nós já conhecíamos o lado militante do Benetazzo, a sua luta contra o regime autoritário para estabelecer a democracia. Seus companheiros de militância nos contavam sobre suas múltiplas e precoces habilidades, de sua sensibilidade. Mas poucas pessoas conheciam a fundo o seu lado artístico e, ainda menos, a dimensão de sua obra”, afirmou Carla Borges, coordenadora de Direito à Memória e à Verdade da Prefeitura de São Paulo.

Para ela, o projeto tem dois objetivos: promover uma reparação simbólica para alguém que foi assassinado e enterrado como indigente; e devolver à cidade o direito a ter acesso a essa obra artística, até então desconhecida. “Hoje podemos dizer que finalmente rompemos definitivamente com o ciclo de violência que começou com a perseguição e morte desse artista militante e que se arrastava até agora, com a ocultação permanente de sua obra”, ponderou.

Para o curador Reinaldo Cardenuto, a abertura da exposição “Antonio Benetazzo, permanências do sensível” também marca a chegada ao espaço público de uma obra por décadas mantida oculta. “A partir dessa descoberta, um novo lugar se estabelece. O artista sai das residências e ocupa a dimensão pública da qual nunca devia ter sido privado”, disse Cardenuto, lembrando que foram os amigos e familiares os responsáveis por manter e cuidar da obra de Benetazzo durante todos esses anos.

A abertura da exposição foi marcada para o dia 1º de abril, mesmo dia dos 52 anos do Golpe de 1964. “Trazê-lo para o tempo presente dá o sentido do quanto não devemos aceitar um retorno a essa época”, lembrou Cardenuto.

Presente na abertura, Rogério Sottili, secretário especial de Direitos Humanos do Governo Federal, igualmente enfatizou o significado do resgate da obra de Antonio Benetazzo justamente no dia que lembra o golpe e o começo do período de exceção. “A abertura da exposição no dia de hoje ganha importância. A ditadura não matou apenas o cidadão Benetazzo. Matou um grande artista. A exposição também é uma homenagem à arte brasileira”, afirmou Sottili.

Ideia semelhante expôs Eduardo Suplicy, em seu último ato como secretário municipal de Direitos Humanos e Cidadania. “Quisera que Benetazzo estivesse ontem com seu espírito na Praça da Sé, quando recordamos o segundo grande comício pelas Diretas Já e fizemos um ato pela democracia. A batalha pela democracia realizada por ele foi tão bem lembrada ontem”, destacou Suplicy, em referência ao ato realizado contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

A exposição
Dividida em seis partes que revelam os eixos temáticos e as variedades estilísticas do autor, a mostra reúne o maior número de obras de Benetazzo já encontradas – todas espalhadas em casas de amigos e parentes. Na mostra o público poderá conhecer cerca de 90 obras, incluindo os desenhos realizados em 1971, quando esteve na clandestinidade, alguns estudos, além de objetos pessoais e cópias do jornal Imprensa Popular, publicação oficial do Movimento de Libertação Popular (MOLIPO), redigido por Benetazzo.

O projeto deu origem também ao documentário "Entre Imagens – (Intervalos)", filme-ensaio dirigido por André Fratti Costa e Reinaldo Cardenuto. O filme foi recentemente exibido na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, onde se destacou e recebeu elogios de críticos e do público. O projeto resultará também na publicação de um livro com artigos da curadoria, de especialistas e reproduções das obras selecionadas para a exposição.

O artista
Uma das fases mais intensas da trajetória artística de Benetazzo ocorreu na segunda metade da década de 1960. Naquele período, professor de Filosofia e de História da Arte no Cursinho Universitário e no Instituto de Arte e Decoração (Iadê), ele compôs mais de 150 obras, com estilos, motivos e técnicas os mais variados.

Dessa época datam autorretratos, retratos de familiares e de amigos, representações do corpo e da sexualidade feminina, abstrações realizadas com cores vibrantes, colagens pop a partir de material publicitário e nanquins, em diálogo com a estética visual dos ideogramas. Benetazzo se dedicou, ainda, à fotografia, incluindo vistas da cidade de Caraguatatuba, detalhes da arquitetura paulistana, cliques de banners espalhados por São Paulo e retratos de populares na rua.

O militante
Simultaneamente às atividades artísticas, Benetazzo ampliou o seu engajamento político. De 1965 em diante, rompeu com o Partido Comunista Brasileiro (PCB) – por ser contra a linha “pacifista” e institucional de resistência aos militares adotada pelo Partidão – e se aproximou da luta armada contra a ditadura. Primeiro se envolveu com a Dissidência Universitária de São Paulo (DISP) e depois, a partir de 1968/69, com a Aliança Libertadora Nacional (ALN). Em 1968, Benetazzo ajudou a organizar o 30º congresso da UNE, em Ibiúna (SP).

Ingressando na clandestinidade em 1969, quando militava na ALN, Benetazzo mudou-se para Cuba onde adquiriu treinamento de guerrilha. Ainda em Cuba, ajudou a fundar um novo grupo de esquerda, o Movimento de Libertação Popular (MOLIPO), que a partir de 1971 passou a realizar várias ações revolucionárias em luta contra o regime militar.

Retornou secretamente ao Brasil na segunda metade de 1971, quando continuou atuando na clandestinidade e ajudou a desenvolver inúmeras ações políticas pelo MOLIPO. No decorrer de 1972, redigiu praticamente todos os textos do Imprensa popular, jornal oficial do MOLIPO, no qual denunciava a ditadura e defendia a luta armada como projeto de resistência contra o regime militar. Capturado por agentes da repressão no dia 28 de outubro de 1972, dois dias depois foi brutalmente assassinado a pedradas, no Sítio 31 de Março, em Parelheiros.

Está disponível no HuffPost Brasil um artigo escrito pela Coordenadora de Políticas de Direito à Memória e a Verdade Carla Borges em parceria com Marília Marie Goulart, Coordenadora do projeto Antonio Benetazzo.
Disponível no link: http://migre.me/tsYgr