A Copa do Mundo em São Paulo

Coluna Ladeira da Memória


Portões monumentais do Estádio do Pacaembu em 1953. (Gabriel Zellaui, DPH/DIM).

Fatima Antunes

16 de julho de 1950: as seleções de futebol do Brasil e do Uruguai se enfrentaram no Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, protagonizando o confronto decisivo da IV Copa do Mundo de Futebol, realizada no Brasil. A memória que se fixou dessa Copa e, sobretudo, da fatídica partida em que o Uruguai venceu o Brasil por 2 gols a 1, enfatizou o Maracanã como o palco principal do torneio e ofuscou a participação de outras cidades brasileiras que também sediaram os jogos. Além do Rio de Janeiro, a cidade de São Paulo foi uma das seis sedes da Copa de 1950, ao lado de Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Recife. Na capital paulista, os jogos ocorreram no Estádio Municipal do Pacaembu, o segundo maior do torneio.

Inaugurado em 1940, o Pacaembu ostentou o título de maior estádio da América do Sul até ser suplantado pelo Maracanã, construído especialmente para a Copa do Mundo. Enquanto o estádio paulistano abrigava cerca de 60 mil pessoas, a capacidade de público estimada do Estádio Municipal do Rio de Janeiro era de 155 mil pessoas.

Pôster oficial da IV Copa do Mundo de Futebol, no Brasil. (FIFA, divulgação).)

Cinco jogos foram realizados no Pacaembu. O primeiro deles foi também o mais concorrido. Suécia versus Itália reuniu 50 mil torcedores. Apesar do entusiasmo e do apoio dos italianos e seus descendentes de São Paulo, a Azzurra perdeu por 2 a 3 para os suecos. A Seleção Brasileira disputou apenas uma partida em São Paulo, contra a Suíça, no dia 28 de junho, com placar final de 2 a 2 e público de 42 mil pessoas. A Itália jogou mais uma vez no Pacaembu, vencendo o Paraguai por 2 a 0. Pela fase final da Copa, enfrentaram-se Uruguai e Suécia (3 x 2) e Suécia e Espanha (3 x 1), jogo este realizado no dia 16 de julho, no mesmo horário em que jogavam Brasil e Uruguai no Rio de Janeiro. O público foi pequeno: 18 mil torcedores se dirigiram ao Pacaembu, enquanto os brasileiros ouviam a transmissão da partida entre Brasil e Uruguai ao pé do rádio.

Na São Paulo de 1950, para chegar ao estádio, os torcedores poderiam escolher entre as linhas de bondes e os poucos ônibus que circulavam pelas avenidas Angélica, Higienópolis, Dr. Arnaldo, General Olímpio da Silveira e rua Cardoso de Almeida, nas imediações do Pacaembu.  Os paulistanos eram pouco menos de 2,2 milhões. Dos usuários de transportes coletivos da capital, 65% lançavam mão do serviço de bondes, sendo que apenas 35% deles usavam os ônibus, ainda muito incipientes.

O grande objetivo da garotada era o mesmo de hoje: completar o álbum de figurinhas, com as fotos dos jogadores de todas as seleções.  A Indústria de Balas e Chocolates “A Americana”, instalada na rua do Gasômetro, no Brás, era a responsável pela produção das figurinhas sob a marca “Balas Futebol”. Diferentemente de hoje, em que as figurinhas são vendidas em bancas de jornal, cinco em cada pacotinho, as figurinhas da Copa de 50 vinham enroladas em balas, compradas em armazéns. Havia as chamadas “figurinhas difíceis”, editadas em pequeno número, e também as “figurinhas carimbadas”, mais difíceis que as difíceis e praticamente impossíveis de serem encontradas, pois davam direito a prêmios. Eram poucos, portanto, os que conseguiam completar o seu álbum. As figurinhas repetidas não eram descartadas: eram garantia certa de diversão nos duelos de “abafa”.

A capa do álbum de figurinhas das "Balas Futebol" exibia as arquibancadas do Pacaembu. (Divulgação).

Nos 60 anos que nos separam da Copa de 1950, muita coisa mudou. Sem o recurso da televisão e das transmissões ao vivo, via satélite, assistir aos jogos era privilégio de quem comprava um ingresso para acompanhar tudo no estádio. A outra opção era ouvir o jogo pelo rádio, isso para quem tinha um em casa.

Atualmente, a FIFA (Fédération Internationale de Football Association), entidade máxima do futebol, exige condições especiais de locomoção e de acomodação dos torcedores nos estádios. Os assentos têm de ser delimitados e numerados; a visibilidade do campo precisa ser total; são necessárias vagas para estacionamento e o transporte público precisa ser oferecido em quantidade e com qualidade. Com essas medidas, a capacidade de público nos estádios diminuiu drasticamente. As arquibancadas apinhadas, como as que vemos nos antigos filmes oficiais das Copas, se tornaram mesmo coisa do passado.

Enquanto a FIFA decide se um estádio paulistano terá condições de receber os jogos da Copa de 2014, a São Paulo de hoje e seus milhões de habitantes se vestem de verde e amarelo para torcer pela Seleção Brasileira em mais uma Copa do Mundo.