SMC Em Foco: para Raquel da Silva Oliveira, bibliotecas devem ser locais de inclusão e de acolhimento

Confira o perfil da coordenadora geral do Sistema Municipal de Bibliotecas

Raquel da Silva Oliveira é coordenadora geral do Sistema Municipal de Bibliotecas e tem um sonho:

- Quando ando pelo centro e pela periferia de São Paulo em visita às 54 bibliotecas públicas, aos 13 bosques de leitura e aos 15 pontos de leitura que coordeno, e vejo tanta gente nas ruas em condições de vulnerabilidade, sonho que um dia todas essas famílias terão seu lugar para morar e que todas essas crianças estarão na escola e frequentando os nossos equipamentos em busca de conhecimentos que possam tornar suas vidas melhor. Sei que, para muitos, isso pode parecer utopia, mas, se cada um de nós fizer a sua parte, a distância que nos separa desse ideal será cada vez menor.

Nesse sentido, Raquel, pelo menos, está fazendo a parte dela. Desde que assumiu as funções de coordenadora, em 2018, sua primeira preocupação foi a de atrair os usuários e aumentar o seu número.

- Eu ficaria satisfeita se, no meu primeiro ano de gestão, com as medidas adotadas, o público fosse dez por cento maior, mas, para minha surpresa, o aumento foi de 34 por cento. A estratégia foi a de estudar o perfil dos frequentadores, estabelecer um processo de aquisição de livros que fosse ao encontro do desejo do usuário e, principalmente, incrementar no funcionário a importância de sua função social, tendo como resultado uma política de melhor atendimento e acolhimento. E foi assim que, antes da pandemia, chegamos a atender mais de um milhão e quatrocentos mil leitores, patamar que, pouco a pouco estamos agora restabelecendo.


Um público diversificado
Segundo informa Raquel, o Sistema de Bibliotecas trabalha com quatro públicos diferentes: crianças, estudantes, adultos e idosos.

- Precisamos atender às necessidades de cada um desses segmentos. O maior número deles é o de mulheres na faixa etária dos quarenta anos, que vem em busca de livros para levar para seus filhos, netos, pais, maridos, avós e outros familiares. Em seguida, estão a crianças que, além da leitura, frequentam as atividades lúdicas como as salas de jogos de tabuleiro e as sessões de contação de histórias, cinema e teatro.

Não queremos ninguém ocioso em nossas unidades. Assim, para as senhoras que acompanham seus filhos e netos temos em nosso acervo revistas e livros que contemplam seus anseios seja no ramo da culinária, bordado, ginástica ou trabalhos manuais, com atividades afins, como o clube do fuxico, as aulas de yoga, de dança e de exercícios físicos, bem como as de trabalhos manuais.

Os estudantes pesquisam e fazem suas lições de casa, enquanto os idosos, além de lerem os jornais diários, jogam xadrez e participam das programações próprias para sua faixa etária.

Existe uma interação natural entre os usuários. Sempre digo que, se nas cidades litorâneas, as praias são um fator de socialização, aqui na cidade, em especial nas periferias, as bibliotecas acabam assumindo essa função. E é tudo de graça! É só entrar e participar.

Os vulneráveis

Desde que assumiu a coordenação do sistema de bibliotecas, Raquel da Silva Oliveira tem dado uma atenção especial às pessoas em condição de vulnerabilidade.

- Embora não sejamos da área de assistência social, não podemos ignorar que eles existem e muitos fazem das bibliotecas seu único refúgio. Na Mooca, por exemplo, desde as oito horas da manhã, quando abrimos, na Biblioteca Aflfonso Taunay já tem uma fila de sem-teto esperando para entrar e passar boa parte do dia dentro da casa.

No bairro do Pari, por sua vez, a Biblioteca Adelpha Figueiredo tem dado uma atenção especial aos imigrantes latino americanos, africanos e asiáticos, auxiliando-lhes, dentro do possível, na obtenção e documentos e outras necessidades (até as embaixadas de vários desses países já nos agradeceram por esse atendimento prestado aos seus conterrâneos).

Outra preocupação é com as pessoas deficientes: Todas as bibliotecas são dotadas de óculos OrCam, que auxiliam os cegos na consulta de livros e, para o ano que vem, estamos abrindo licitação para a compra de livros em Libras para serem utilizados pelos deficientes auditivos.

- Enfim, sempre enfatizo para os meus funcionários que a função básica das bibliotecas é de inclusão e de acolhimento.
Temos tido também o interesse em valorizar novos escritores e pequenas editoras e, para o próximo ano, pretendemos instalar salas de game em todas bibliotecas, além de realizar a compra de livros digitais.

Algumas histórias

Entre as muitas histórias que mostram como seu trabalho é gratificante, Raquel pinça três:

Um senhor que reclama com ela de que adianta as bibliotecas terem tantos livros se ele não sabe ler. O que ele queria mesmo era uma cartilha. – Dei-lhe toda a razão e a partir daí providenciamos para que todas as bibliotecas tivessem em disponibilidade cartilhas e livros para as primeiras leituras.

Um garoto de uma família árabe que só retirava livros de culinária e inquirido sobre a razão disso responde: Minha mãe cozinha mal pra burro, mas com os livros de receita que levo, as coisas melhoraram um pouco lá em casa.

Um morador de rua que passou um ano dentro da biblioteca se preparando para um concurso e hoje, além de ser auditor fiscal, escreve poesias.

Gosto do que faço

Embora não concorde com todas as ideias do autor Monteiro Lobato, Raquel acredita que numa coisa ele tem razão: “Um país se faz com homens e livros”.

- E é por isso que eu, e minha maravilhosa equipe, batalhamos cada dia para trazer mais pessoas para a leitura.

- Quem ingressa no universo da leitura, nunca mais consegue se afastar dele. Aprendi isso ainda criança, quando morava na Vila Matilde e minha mãe, a querida Dona Neusa, diariamente, atravessava a linha de trem para nos levar, a mim e as minhas três irmãs – Luciana, Patrícia e Marcela – à biblioteca da Mooca e nos aconselhava: “se quiser ser alguma coisa na vida, leia e estude”.

O incentivo de Dona Neusa valeu: o amor aos livros adquirido por Raquel e suas irmãs na infância se prolonga até hoje e se refletiu, inclusive em suas vidas profissionais – as quatro seguiram a área de biblioteconomia.

Raquel começou a lecionar aos 19 anos em escolas de ensino infantil e em ONGS voltadas à educação. Depois de formada em Pedagogia e Biblioteconomia, passou a atuar em bibliotecas universitárias e dar aulas em faculdades. Ingressando por concurso na Prefeitura, ocupou durante seis anos a coordenação dos processos técnicos (Catalogação) da Coordenadoria do Sistema Municipal de Bibliotecas (CSMB), foi diretora de uma biblioteca de bairro e, desde junho de 2018, assumiu a Coordenação Geral da rede de bibliotecas da CSMB.

- Dizem que trabalho demais, mas, quando a gente ama o que faz, pode, como eu, passar doze, quatorze ou mais horas no serviço que nem sente o tempo passar.

Alegria, alegria

Mas não pensem que a vida de Raquel se resume ao seu trabalho com as bibliotecas.

- Sou alegre por natureza, entro e saio cantando do serviço, mas adoro uma praia, uma balada e me reúno com frequência com meus amigos para jogar conversa fora e tomar um chopinho ou uma caipirinha. E, além do mais, minha mãe, minhas irmãs, meus cinco sobrinhos e toda minha família, que é muito unida, estão sempre comigo e me dão o maior apoio.