Após Os Pescadores de Pérolas, vem aí Candide, uma ópera contra a intolerância

Moisés Santos/Ciro Bonilha

Cerca de mil pessoas por espetáculo puderam assistir à temporada da primeira ópera produzida em 2005 no Theatro Municipal de São Paulo, Os Pescadores de Pérolas, de Georges Bizet. A montagem, que teve a participação do Coral Paulistano e foi bem recebida pela crítica e pelo público, já foi alugada pela fundação Clóvis Salgado, em Belo Horizonte, e será exibida no Palácio das Artes em outubro.

Ainda em outubro, entra em cartaz no Municipal de São Paulo uma nova ópera: Candide, de Leonard Bernstein, com regência e direção musical de José Maria Florêncio, direção cênica e iluminação de Jorge Takla, cenários e figurinos de Charles Moeller, além da participação da Orquestra Sinfônica Municipal e do Coral Lírico. No Rio, onde a Ópera foi encenada em 2002, cantaram Fernando Portari (Candide), Denise Tavares (Cunegonda), Regina Elena Mesquita (Velha Senhora) e Sandro Christopher (Pangloss). Em São Paulo, o elenco também contará com Portari, Regina Elena e Christopher. Assim, a única novata entre os protagonistas de São Paulo será Rosana, que faz par com o tenor Fernando Portari também fora dos palcos.

Macarthismo

Candideé uma obra satírica escrita na década de 50 que faz uma dura crítica ao totalitarismo, ao macarthismo e à perseguição de artistas e figuras públicas consideradas "comunistas" pelo Comitê de Atividades Antiamericanas, instituído pelo então presidente Dwight Eisenhower. Leonard Bernstein, na época com pouco mais de 20 anos, fez sua estréia (de última hora) à frente da Filarmônica de Nova York, substituindo o lendário Dimitri Mitropoulos, sendo aclamado como a grande revelação da regência norte-americana, o que na época era considerado algo valoroso, principalmente se considerarmos que as principais orquestras dos Estados Unidos das décadas de 50 e 60 eram dirigidas por europeus que chegavam ao país refugiados do regime nazista.

Sobre Candide, muitas páginas já foram escritas para se tentar definir o estilo da obra. Há controvérsias em se tratar de uma ópera, de uma opereta ou de um musical. O que se sabe é que o espetáculo é constituído por uma série de cenas baseadas no romance homônimo de Voltaire, que criticava fortemente os costumes de sua época. Em sua versão musical, Bernstein se insere no rol dos artistas conscientes politicamente e critica indiretamente o período obscuro do macarthismo, que atingiu cerca de 6 milhões de norte-americanos.

Ao longo dos anos, a partitura de Candide sofreu diversas alterações que parecia difícil aproximá-la do original, o que acabou sendo feito pelo próprio Bernstein em uma apresentação memorável feita em Londres, no fim da década de 80. Todo esse clima estará de volta ao palco do Theatro Municipal.

A idéia é que, a partir de agora, óperas como essas e outras importantes montagens sejam apresentadas em São Paulo com o apoio da recém-inaugurada Central de Produção Chico Giacchieri, em um galpão na Vila Guilherme. "Daqui para frente, a montagem de um repertório de óperas e a troca e o aluguel de produções será a política da Secretaria de Cultura, como, aliás, já acontece nos grandes centros operísticos do mundo", diz Jamil Maluf.

Dentro desta nova perspectiva de intercâmbio de produções, o Teatro Amazonas, em Manaus, exibiu, durante seu festival de óperas deste ano, uma produção paulistana de O Barbeiro de Sevilha, de Rossini. Mandará, em troca, os cenários e os figurinos de Condor, ópera composta por Carlos Gomes. O espetáculo, criado por Bruno Berger-Gorski, deve estrear na cidade no dia 25 de novembro, também em cinco únicas apresentações.