Dia da Gratidão: praticar o agradecimento pode transformar vidas

A prática da gratidão é estimulada em datas diferentes ao redor do mundo e reverenciada em festas pagãs ou religiosas; exercitá-la traz bem-estar, paz interior e maior autoconfiança, especialmente em tempos de Covid-19

 

 

Texto: Lorenzo Petillo/Rosangela Araujo
Fotos: Acervo

 

Desmontar árvore de Natal em 6 de janeiro se tornou uma tradição conhecida por causa do calendário cristão, que celebra nesta data o Dia de Reis, um marco que simboliza, todos os anos, o encerramento das festas pelo nascimento de Cristo. O que pouca gente sabe, porém, é que, no Brasil, na mesma data se comemora, também, o Dia da Gratidão.

Nesta quinta-feira (6), então, é dia de agradecer pelo que se passou, conquistou, enfrentou, viveu. É dia de expressar e de sentir gratidão pela vida, e, em tempos de pandemia de Covid-19, o fato de estar vivo.

Praticar o exercício da gratidão e nutrir esse sentimento são atitudes que fortalecem, geram bem-estar, ativam as melhores substâncias responsáveis pelo contentamento no cérebro e atraem mais coisas boas, segundo atestam tanto diferentes crenças religiosas, quanto a metafísica e a neurociência.

A importância de tudo isso foi vivida também pela Secretaria Municipal de Assistência Social (SMADS) ao longo da pandemia.

Nos momentos mais difíceis para muitas pessoas, como no caso da descoberta do contágio por Covid-19, a SMADS ofereceu um lugar especializado no acolhimento daqueles que precisavam, além de cuidados médicos, de um local para se fortalecer e aguardar pela recuperação sadia do corpo e da alma.

Hoje, quem sobreviveu à Covid, sejam pessoas atendidas ou funcionários da linha de frente na rede municipal de Assistência Social, tem muito o que comemorar neste Dia da Gratidão.

Gratidão pela oportunidade de ter uma nova relação com a vida

É o caso de Chico, um homem de 41 anos, políglota, que estava em situação de rua quando começou a sentir os primeiros sintomas de cansaço e tosse. Ele procurou a equipe técnica de um Centro de Acolhida na região Central e, em razão de sua fragilidade aparente, foi logo encaminhado para uma Unidade Básica de Saúde (UBS) para a realização de teste.

Quando o exame de Covid deu positivo, Chico ficou surpreso e sentiu medo. “Eu estava sabendo da doença, mas não imaginava que pegaria. Senti medo da morte quando soube que estava com Covid”, conta.

A partir do diagnóstico confirmado, a equipe encaminhou Chico para o Centro de Acolhida Emergencial para Covid-19*: “Lá fiquei isolado 11 dias, pensando na vida, na minha condição e o que teria de fazer para sobreviver. Não fiquei tão mal, mas vi pessoas serem transferidas para o hospital; foi bem difícil”.

Após a fase de isolamento social, Chico aceitou ir para o Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica (SIAT) II Glicério** e realizar tratamento para seu uso abusivo de drogas. “Senti que precisava ter outra relação com a vida, o tratamento está fazendo eu pensar na minha família, nos meus filhos e, inclusive, se devo permanecer ou não no Brasil, apesar de gostar muito daqui. Tenho parentes nos Estados Unidos e na França, chegou o momento de decidir e recomeçar”, pondera Chico.

Ele diz agradecer a todos que participam do caminho para sua recuperação. “Muita gratidão por aqueles que servem meu alimento, pela pessoa que faz o pudim de chocolate mais inesquecível (risos) e, principalmente, pelas conversas de incentivo que sempre estão presentes na minha relação de tratamento. Tenho muito a agradecer. Estou vivo e
em recuperação”
, completa Chico.

Gratidão pelo desenvolvimento da ciência e do Sistema de Saúde

A gratidão também passou a fazer parte com mais intensidade da rotina dos funcionários da rede que tiveram Covid-19.

Sempre tive o hábito de me cuidar, com alimentação saudável, exercícios diários e, com a pandemia, redobrei os cuidados com a higiene”, relata a coordenadora do Centro de Referência da Assistência Social (Cras) Santo Amaro, Maria Antonia, que contraiu Covid-19 em agosto do ano passado.

Foi uma surpresa receber o diagnóstico positivo de Covid-19. Estava cansada no trabalho, procurei um serviço médico e descobri, por meio do teste, que estava com o vírus”, conta.

A coordenadora Maria Antônia acrescenta ainda que após cinco dias de sintomas sua oxigenação ficou abaixo de 90% e o exame de tomografia revelara que seu pulmão tinha sido atingido em mais de 50%.

“No começo chorava muito, não acreditava que tinha sido contaminada. Estava extremamente cuidadosa, porque tinha perdido dois sobrinhos e minha irmã para a Covid” lembra. “Passando os dias na internação fui positivando minha mente, pensando que iria superar a situação, e fui ficando forte, confiante. Eu agradecia a oportunidade de estar em um hospital tinha tomado duas doses de vacina, cuidava do meu corpo, da minha alimentação; tenho boa saúde, vou sobreviver, eu pensava assim, o tempo todo”.

Após a internação, Maria Antonia sentiu receio com o retorno ao trabalho. Ela ficou com sequela no fígado e mantém tratamento até hoje. “Novamente recebi apoio da equipe de trabalho, dos familiares e dos amigos para retornar à rotina. A colaboração das pessoas ajuda muito no fortalecimento da gente, me ajudou a recuperar confiança, sou muito grata.“

Gratidão pela amizade

O adolescente Dinho (nome fictício), de 14 anos, ficou isolado dois dias em um quarto do seu próprio Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes (Saica) *** assim que teve o diagnóstico de Covid-19 confirmado. Ele lembra que ficou inconsolável por ter que ficar sozinho.

Quando soube que existia outro Saica (M’ Boi – Covid-19 ) que recebia crianças com Covid-19 ficou desconfiado de que poderia ser um lugar mais isolado e parecido com um Hospital. A chegada no local para o qual foi transferido provou o contrário. “Como as crianças não tinham sintomas, nós brincávamos, conversávamos, estudávamos todos juntos, era uma casa que tinha tudo. Só não podíamos sair na rua. Fiz novas amizades, adorava os educadores, eles eram muito legais”, lembra Dinho.

Ele explica que no Saica havia enfermeiras 24 horas, que todos usavam roupas especiais, e que em nenhum momento sentiu-se triste, só quando foi embora. "Eu agradeço por ter feito novos amigos e por todos os funcionários terem cuidado de todos nós na casa", afirma o adolescente.

O ser grato pode ajudar a construir resiliência, como Dinho fez. Transformar adversidades em possibilidades pode contribuir para transmutar dias difíceis. A gratidão nutre sentimentos de satisfação por aquilo que se tem de melhor: a vida e o dia de hoje

Em festas pagãs ou cristãs,  a gratidão está presente como Ação de Graças de todos os anos

O Dia da Gratidão é comemorado, no Brasil em 6 de janeiro, por inspiração da data reservada para celebrar o Dia de Reis.

O Dia de Reis representa, no calendário e tradição cristã, a data em que três Reis Magos do Oriente chegaram para visitar Jesus Cristo em seus primeiros dias de vida, trazendo presentes. O dia marca oficialmente o encerramento do período de festas e homenagens pelo nascimento de Cristo.

Já em nível internacional, o Dia Mundial da Gratidão é comemorado em 21 de setembro desde 1965, quando um encontro no Havaí, nos Estados Unidos, reuniu pessoas motivadas a designar um dia do ano para praticar rituais de agradecimento.

Nos Estados Unidos e no Canadá, o dia escolhido para demonstrar Gratidão é conhecido como Thanksgiving Day (Dia de Ação de Graças). Ele sempre é comemorado na quarta quinta-feira de novembro entre os norte-americanos, e na segunda-feira da segunda semana de outubro entre os canadenses.

O Thanksgiving Day foi instituído nos EUA para celebrar o fim da temporada de colheita de alimentos nos campos. É um feriado tradicional, muito comemorado e reverenciado tanto nos EUA quanto no Canadá. É dia de reunir família e amigos para agradecer o que de bom aconteceu durante o ano, sempre com fartura de alimentos. As comidas típicas dessas celebrações costumam ser abóboras, tortas de maçãs e de nozes, cookies, batatas doces, purê de batatas, molho de cranberry e peru.

Em 1621, imigrantes ingleses convidaram índios nativos americanos para celebrarem com eles a fartura na colheita de milho. Oficialmente, nos Estados Unidos, o feriado foi decretado em 1939 pelo presidente Roosevelt. Já no Canadá, a primeira ceia de agradecimento foi feita pelo explorador inglês Martin Frobisher em 1578. A celebração se dava por Frobisher estar vivo após uma longa viagem. O Parlamento decretou que, a partir de 1957, toda segunda segunda-feira de outubro seria Dia de Ação de Graças.

Vale lembrar que esses são exemplos e que, em muitos outros países também há datas diferentes reservadas para a Gratidão ou a Ação de Graças.

A Neurociência explica a importância da gratidão

Para a neurociência, quando as pessoas expressam gratidão ativam o sistema cerebral localizado no núcleo Accumbens, responsável pelas sensações de prazer, contentamento e bem-estar. Quando o cérebro reconhece que o sentimento é o de estar agradecido, libera dopamina, um importante hormônio que melhora a motivação e a vontade de realizar coisas. Além deste hormônio, a gratidão também pode estimular as vias cerebrais, por meio da oxitocina, que influencia as emoções, o afeto, e dissolve sentimentos de medo, raiva, angústia e fobias.

 

Serviços Socioassistencias


* Centro de acolhida emergencial Covid-19 - Trata-se de um serviço executado pela SMADS por meio da organização social APOIO, que, em atendimento ao decreto municipal 59.283, de 16/03/2020, se destina a compor o enfrentamento aos rebatimentos da Pandemia de Covid19 junto à população em situação de rua na cidade de São Paulo. O serviço realizava atendimento de usuários das redes socioassistencial e de saúde que estivessem com suspeita ou confirmação de Covid19 para isolamento social. A quantidade de usuários atendidos no C.A Covid-19 foi de 2957 pessoas entre 01/04/2020 e 17/12/2021.

**SIAT II Glicério - Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica (SIAT) II Glicério: considera as múltiplas possibilidades terapêuticas assegurando a singularidade de
cada indivíduo, de acordo com o Decreto nº 58.760, de 20 de maio de 2019. O serviço registrou de 01 de janeiro de 2021 a 30 de novembro de 2021 um total de 55.144 acolhimentos, referentes a 2.788 pessoas acolhidas. Também foram realizados 27.811 atendimentos de saúde referentes a 2.226 pacientes.

***Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes - Oferece acolhimento provisório e excepcional para crianças e adolescentes de ambos os sexos em situação de medida de proteção, risco pessoal, social e de abandono, cujas famílias ou responsáveis encontrem-se temporariamente impossibilitados de cumprir suas funções de cuidado e proteção. O Saica Covid funcionou entre março e outubro de 2020.