Prefeitura de São Paulo encaminha crianças e adolescentes para famílias acolhedoras

Sem restrições de renda familiar, gênero, ou estado civil, o serviço conveniado à Assistência Social prepara pessoas que queiram cuidar provisoriamente de uma criança ou adolescente

Da esquerda para a direita: Manuela (17), Isabella (24), Cristiane Caires Roque (47) e Manoel Estevão Roque Filho (48), família de comerciantes da zona sul, falam sobre a experiência de participar do curso de capacitação para ser uma Família Acolhedora. Eles estão sentados na sala de estar do serviço de Santo Amaro.


Texto: Rosane de Pietro
Fotos: Wagner Origenes

O Família Acolhedora é um serviço da Prefeitura Municipal de São Paulo implantado por meio da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS).Trata-se de acolhimento provisório para crianças e adolescentes que estejam afastados do convívio familiar, seja por meio de medida protetiva, ou cujas famílias (ou responsáveis) encontram-se temporariamente impossibilitados de cumprir sua função de cuidado e proteção.

Vanea Bezerra Cruz da Silva (53), está no programa Família Acolhedora desde o final de 2016. Em 2017, participou de uma reunião na Associação Brasileira Beneficente Aslan (ABBA), uma das Organizações da Sociedade Civil (OSC) que desenvolve o programa Família Acolhedora em parceria com a prefeitura de São Paulo. Primeiro, Vanea, acolheu um bebê de sete meses, cuidando da criança por um ano e meio. Atualmente, está no seu segundo acolhimento temporário, um rapaz de 17 anos. “Adolescente é mais fácil, a gente pode conversar e ensinar o que é uma família estruturada, com regras, com respeito. Minha família não é perfeita, mas é capaz de ensinar as coisas da vida.”

Uma pessoa maior de 18 anos, sem restrição de gênero ou estado civil pode ser uma família acolhedora. Também não existem restrições sobre renda familiar, desde que a pessoa tenha possibilidade de oferecer moradia e estrutura básica para o crescimento da criança. O fundamental é ter disposição afetiva e emocional para proporcionar um ambiente familiar à criança, até que seja viabilizado o retorno ao convívio com a família de origem ou, na sua impossibilidade, encaminhamento para adoção.

Nem sempre é o momento propício para pensar em acolhimento de uma criança, como contam Edilene Gomes de Almeida (51) e João Noé Filho (56), que acolheram uma menina com 14 dias de vida. “Ela veio junto com a pandemia”, diz Edilene. “Minha filha estava grávida quando recebemos a notícia que havia um bebê precisando de cuidados”. Minha filha falou para nós: “Não tem problema algum, a gente vai se ajudando”. A menina nasceu no Hospital do Campo Limpo com vários problemas de saúde. Edilene comenta que “a médica, quando soube que a gente ia ficar com a menina, tratava a gente com muito carinho e nos encorajou a levantar adiante o programa. Um mês depois, o bebê parecia outra criança. Realmente, cuidar de um bebê com problemas de saúde, não é fácil, mas tem muita recompensa. A criança foi direcionada à família adotiva e nós vamos sempre nos orgulhar de ter participado de um momento tão difícil na vida dessa menininha”, diz João.

Cristiane Caires Roque (47) e Manoel Estevão Roque Filho (48), comerciantes da zona sul da cidade, ficaram impressionados com as histórias de um cliente em especial: Delton Hochstedler (41), gestor do serviço Família Acolhedora de Santo Amaro. “Como conversamos muito com nossos clientes, ficamos sabendo do Programa Família Acolhedora com o Delton. Sempre tivemos vontade de adotar uma criança, a ideia de fazer um acolhimento temporário despertou nossa curiosidade, diz Manoel.

Isabella (24), filha mais velha do casal Cristiane e Manoel, comenta que ela mesmo se questiona “como posso gostar tanto de uma pessoa que não conhecia e que sei que ela vai ficar conosco só por um tempo?” “Manuela, assumiu o papel de educadora”, diz Isabella em citando sua irmã mais nova, de 17 anos. As irmãs comentam que amadureceram com a responsabilidade de cuidar da bebezinha de 9 meses que está com a família. O pai acrescenta: “Ser acolhedor é ser útil a alguém, mexe com você, muda tudo. É uma grande lição de vida e de humanidade que a nossa família está tendo com essa bebezinha em casa”.

O serviço oferece preparação e treinamento para potenciais acolhedores encararem os desafios que envolvem uma criança durante um período de vulnerabilidade. “Fizemos dez encontros que fazem parte do programa de capacitação, lembra Cristiane. “Todos da família foram: eu, meu marido e as nossas duas filhas. Todos gostaram da ideia. O curso de capacitação nos mostrava a realidade, antecipava as nossas dúvidas e coloca todos os assuntos em pauta. Foi extremamente enriquecedor.”

A capacitação aborda as diferentes etapas que um acolhimento provisório perpassa, mesmo até antes de o período de acolhimento começar. A capacitação é ministrada por assistentes sociais e psicólogos. Raquel Hatcher (45) psicóloga e vice coordenadora da unidade Santo Amaro, descreve a estrutura da casa: “Somos três psicólogos e três assistentes sociais, que não param na pandemia, nosso serviço é de alta complexidade, é essencial”. Atualmente, a unidade de Santo Amaro atende 14 famílias. “São 30 vagas e já contamos com cinco famílias interessadas em participar no próximo módulo de capacitação”.
Uma das dúvidas que sempre entra em pauta entre famílias acolhedoras, é o fato de o acolhimento ser temporário, até que a criança volte para família de origem, ou seja direcionada à adoção definitiva. A família acolhedora é preparada e capacitada para participar de todas etapas que envolvem o processo, sendo acompanhada pelo serviço de assistência psicossocial.

Atualmente, o serviço é realizado em três unidades com capacidade de direcionar 30 crianças em cada, totalizando 90 vagas, considerando que cada família acolhedora deverá acolher uma criança por vez, exceto quando se tratar de grupo de irmãos, quando esse número poderá ser ampliado. Todas as etapas do processo de guarda provisória ficam a critério da avaliação da equipe técnica do serviço.

As unidades regionais dos Centros de Referência Especializados da Assistência Social (CREAS) são responsáveis por acompanhar, monitorar e avaliar a evolução da execução do Família Acolhedora, oferecendo também suporte técnico às organizações parceiras e executoras do processo.

O Família Acolhedora está estruturado no Artigo 227 da Constituição Federal Brasileira e no artigo 34, parágrafo 1º. do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) - que prioriza o direito à convivência familiar para crianças e adolescentes.

 

Edilene Gomes de Almeida e João Noé Filho, casal na faixa de 50 anos, sendo atendidos no serviço. Eles já acolheram temporariamente uma menina com 14 dias, que atualmente foi direcionada à família extensa.

 

Vanea Bezerra Cruz da Silva, 53 anos, já acolheu um bebê de sete meses e, atualmente, está no seu segundo acolhimento temporário, um rapaz de 17 anos. Vanea está sentada em um poltrona no berçário da unidade Família Acolhedora de Santo Amaro. Brinquedos infantis e prateleiras com livros compõem a decoração.