Saúde mental na juventude é tema de debate entre profissionais da rede pública de Saúde e da Educação

O evento ocorreu no Auditório do CEU Rosa da China, na sexta-feira, 4 de agosto

Por Camila Mayume

Durante o Seminário Juventude e Sofrimento, realizado no último dia 04 de agosto, no auditório CEU Rosa da China, cerca de 450 pessoas participaram dos debates sobre a saúde mental, os conflitos, os sofrimentos e os desafios enfrentados pelos adolescentes na atualidade. A atividade foi organizada pela Supervisão Técnica de Saúde Vila Prudente Sapopemba em parceria com a Assessoria Técnica de Saúde da região e a Equipe de Educação Permanente da Organização Social em Saúde SPDM-PAIS.

A abertura foi conduzida por Paula Pavan, Interlocutora da Saúde Mental do território de Vila Prudente/Sapopemba, seguida da apresentação da pediatra/hebiatra Elza Maria Branco Padrão, da Unidade Básica de Saúde Dr. Eduardo Romano Reschilian, da região do Ipiranga, que destacou a falta de espaço e de oportunidades destinados aos adolescentes na sociedade.

"É muito importante os profissionais das unidades conhecerem e ouvirem cada adolescente que procura o serviço e assim identificar o perfil de cada um. Às vezes, algumas UBS marcam passeios com os jovens pela manhã, pois dependendo do local só abre ao público nesse período do dia. Entretanto, alguns adolescentes, que estudam no período matutino, ficam desassistidos, porque não conseguem participar dessas atividades”, destacou a médica.

Um exemplo de espaço de ações para todas as idades, inclusive para os adolescentes, é o Grupo de Ritmos de Rua da UBS Jardim dos Eucaliptos, que foi apresentado durante o seminário por Jonas da Silva Almeida, psicólogo do Núcleo de Apoio da Saúde a Família (NASF). Segundo Jonas, o grupo é uma espécie de movimento cultural em que os adolescentes podem conviver uns com os outros e ainda praticar dança, arte e música.

“Trata-se de um ambiente em que eles se sentem à vontade para se abrir, expressar seus sentimentos, dizer o que pensam e receber críticas, se necessário”, relatou Jonas Almeida, que tem o auxílio dos colegas de trabalho Juliana Gonçalves, Agente de Promoção Ambiental (APA) e Felipe Martins Oliveira e Rodrigo Luiz de França, ambos Agentes Comunitários de Saúde (ACS).

Ainda de acordo com o psicólogo, o grupo segue algumas regras em caso de algum jovem desrespeitar ou ser agressivo com os demais integrantes. Entre elas, todos os participantes e profissionais presentes na atividade devem ‘pagar’ flexões. “Respeitar e aceitar as características do próximo é primordial para esses adolescentes, eles se sentem acolhidos”, concluiu o psicólogo.

Autoagressão / automutilação

Ainda durante o seminário, o público acompanhou as explicações sobre casos de ‘cutting’ (automutilação) e autoagressão abordados por Júlia Hatakeyama Joia, psicóloga do CAPS Infanto Juvenil Vila Prudente Girassol. Na ocasião, a convidada explicou que a automutilação e o suicídio são coisas distintas e muitos adolescentes se automutilam como uma forma de se autoconhecer, de se expressar ou chamar atenção. “Os cortes são momentos de tristezas silenciadas dos jovens, que estão passando por problemas e ‘ninguém’ vê. Mas nem sempre isso traz um desejo de morte. Já tive casos de usuários que relataram se sentir pressionados e os cortes estavam relacionados com traumas muito impactantes, sofrimentos que ‘não podiam’ ser ditos. Em geral, os adolescentes não conseguem constituir um canal de conversa quando estão com problemas”, reitera a psicóloga.

Ainda sobre o tema, o psicólogo Sandro Andrade e a psicanalista Priscilla Prada, ambos do Núcleo de Atenção à Infância e à Juventude do Instituto Sedes Sapientiae, também contaram o caso de uma paciente (Luna), que começou a se cortar ao sofrer crises de ansiedade e quando não sabia resolver algum problema. “Vivemos em um mundo sem paciência, em que os outros não dão ouvidos aos sofrimentos desses adolescentes. A angústia não tem um ‘objeto’ para aparecer, os jovens apenas sentem. As dores dos cortes fazem com que aliviem este sentimento”, pondera Sandro Andrade.

Para a psicanalista Priscilla Prada, o trabalho com os jovens é mais de construção do que de interpretação. “É o momento da vida em que ficam muito desconfiados por justamente estarem construindo uma identidade. E isso não é culpa dos pais, mas é de sua extrema responsabilidade procurar algum tratamento para os seus filhos”, orienta ela.

Diálogo aberto animou os debates com o público presente

Ao final das apresentações, o público participou de um debate sobre os aspectos tratados no seminário e esclareceram dúvidas com os convidados, como por exemplo, o papel da escola em conjunto com as unidades. “É fundamental a integração da escola com a unidade de saúde que possui algum grupo para adolescentes. Afinal, nas escolas muitos profissionais percebem os diferentes comportamentos de alguns alunos, comunicam os pais e indicam alguma UBS que possa ajudar com o tratamento de seus filhos”, explicou Jonas da Silva.

O psicólogo do NASF ainda enfatizou como os trabalhadores da saúde podem ouvir essa parcela da população. “Muitos adolescentes perdem a confiança na família e até em si mesmos, situação que os leva a atitudes como se automutilar, por exemplo. Esses sinais precisam ser processados e apenas falar que eles precisam ser fortes não os ajudará. O importante é ter paciência, dar ouvidos a esses jovens e criar mais espaços para que eles possam realmente existir e se encontrar”, acrescentou.

Na opinião de Paula Pavan, da Saúde Mental da região, o evento superou as expectativas. “Encontros como esse fortalecem muito o nosso trabalho, fazem com que todos os parceiros se conheçam e possam trabalhar em rede de uma forma mais efetiva”, concluiu.