Em batalhas, versos recitados são traduzidos em poesias de sinais

Acessibilidade em Libras transformou os saraus durante a Virada Cultural

No ambiente descontraído do palco da Praça Pedro Lessa, no Anhangabaú, a intérprete de Libras, Priscila França, chamava atenção ao traduzir os versos dos poemas recitados nas batalhas de sarau do Slam 13, enquanto o apresentador falava ao microfone e interagia com os presentes, que pareciam ser amigos de longa data e tentavam se esconder do sol da tarde de domingo debaixo das árvores. Engajados, os temas tratados iam desde contra a redução da maioridade penal e movimentos de resistência da periferia a sustentabilidade e tecnologia. Os jurados eram escolhidos aleatoriamente e recebiam plaquinhas para levantarem suas notas, indo de 0 a 13. A torcida não escondia o desagrado quando as notas eram menores que o esperado, expressando sua revolta em tom de brincadeira.

“É uma poesia em si a própria tradução em Libras”, enfatizou o poeta Jonas Worcman, de 20 anos, que acredita na língua como uma arte também e sente vontade de aprendê-la. “É dito que a poesia não está necessariamente na palavra, ela está no sentimento, e ele conseguir passar o que tem em uma frase pelo gesto é muito bonito”, completou. Jonas aproveitou a inspiração para criar em poucos segundos um poema sobre a acessibilidade:

"Secretaria da Pessoa com Deficiência
É fazer inclusão pra gente voltar para a própria essência
E ter consciência do universo
É possível fazer em Libras mais um verso" (Jonas Worcman)


A intérprete Priscila França, de 30 anos, já se identificava com a poesia, chamada de “marginal”, produzida principalmente na periferia, e resolveu participar da batalha com um poema de própria autoria. “Na escola nós aprendemos sobre poetas, mas são poetas que já morreram, então vemos a foto em um livro de um monte de gente barbuda e óculos. De repente, nas redes sociais, fui encontrando pessoas do nosso tempo que são poetas e escrevem sobre o que vivemos, então é uma linguagem com a qual nos identificamos mais facilmente e nos estimula a pensar, a raciocinar sobre a vida louca que vivemos”, relatou Priscila.

Nivaldo Brito dos Santos, mais conhecido como Ni Brisant, explicou que seu nome artístico é a junção do início de cada nome e sobrenomes. O escritor, de 29 anos, acredita no sarau como meio de inaugurar um novo tipo de artista, que não ganha prêmio ou aparece nas mídias, mas tem relevância nos meios em que circula e, no seu contexto, transforma o cenário. “Isso é potencializar o que fazemos, é a marginalidade na essência, trabalhar com as exceções, com pessoas excluídas mas que são presentes, que existem”, comentou Ni Brisant sobre a tradução de Libras no evento.