Como falar para uma criança sobre a morte?

Assunto doloroso mas como as palavras certas tudo pode ser superado

 


De repente alguém tão presente do dia a dia, um parente, um amiguinho, professor ou um animal de estimação não esta mais por perto. Para onde foi, quando volta e como ensinar a suportar a saudade?
Falar sobre o fim da vida para uma criança requer amor, mas principalmente o momento adequado. 
A Psicóloga Erika Pallotino, Mestre em Psicologia Clínica, Especialista em Psicologia Médica e Psicologia em Oncologia e Coordenadora do Instituto Entrelaços, respondeu a algumas perguntas com este tema.  
 
(SFMSP)     Como é a visão infantil da morte?
(Erika P.)     Isso depende de alguns fatores, tais como, a faixa etária da criança e o momento do seu desenvolvimento emocional. Sabemos que a criança pode apresentar dificuldades para entender o conteúdo subjetivo e a permanência da morte. O conceito e a ideia de morte e morrer é, certamente, complexo para o universo infantil. 
 
(SFMSP)     Melhor deixar a criança crescer ou contar logo?
(Erika P.)     A criança que perde um ente querido sente angústia, tristeza e ansiedade pelo seu desaparecimento. Assim como o adulto, a criança tende a reagir com expressão emocional de pesar frente a essa separação. Como, então, não incluí-la nas conversas que a ajudem a entender o que houve com o ente querido falecido? É muito importante que os adultos, mesmo vivendo o seu luto e a sua dor, encontrem uma forma de conversar e explicar para a criança sobre o que ocorreu. Uma vez que a criança receba uma explicação cuidadosa, e tenha compreensão dos fatos, poderá viver o seu processo de luto com fantasias menos ameaçadoras e menos ansiedade. Poderá desta forma, lidar com a realidade da perda. 
 
(SFMSP)     Como explicar o fim da vida de alguém?
(Erika P.)     Algumas famílias, a partir das suas crenças religiosas, poderão oferecer explicações do que creem e acreditam, ajudando as crianças no entendimento deste processo. As crianças, por sua vez, ao se sentirem familiarizadas com essas crenças, poderão encontrar sentido na explicação que recebem.
A orientação importante a ser ressaltada tem a ver com a contra indicação no uso de eufemismo, tais como: “virou estrelinha”, “está no céu”, “ele (a) está dormindo”, e um dos discursos mais graves, especialmente por não ser verdadeiro, “ele (a) foi viajar e não sabemos quando volta.” A criança tem a tendência de buscar o ente querido nos lugares que os adultos, em suas explicações, dizem que estão. O anseio pelo reencontro, a saudade e a dificuldade de entender o conceito de morte podem ser complicadores emocionais para a criança, quando esta não recebe uma explicação coerente para o seu nível de entendimento. A criança pode se sentir abandonada por achar que o ente querido preferiu ir para o céu do que ficar com ela, por exemplo. Isso pode gerar sentimentos que vão desde o abandono, aumento de ansiedade, até desamparo. 
Temos que ter cuidado com as explicações sobre a morte e o morrer no universo infantil. As crianças acreditam e confiam nos adultos, naquilo que eles contam, nas explicações que dão sobre os fatos da vida. Contar a verdade de forma simples e cuidadosa é sempre o melhor caminho. 
 
 (SFMSP)     A partir de que idade a criança tem noção deste fim?
(Erika P.)      Do ponto de vista cognitivo, a partir dos 9 anos de idade a criança já entende conceitos importantes que facilitam o entendimento global do conceito de morte.
É necessário que ela tenha capacidade cognitiva e intelectual para entender três conceitos importantes: irreversibilidade (a morte é irreversível, todos que morreram não irão voltar a viver), universidade (todos morrem, é universal), não funcionalidade (algo morreu porque parou de funcionar, não existe uma forma de melhorar e “consertar”). 
A partir destas ideias a criança poderá entender que a morte é um rompimento radical, que o sofrimento pela ausência de quem amamos existe porque alguma coisa se transformou para sempre. A criança poderá entender o pesar de sua família, sobretudo as expressões de choro e lamento. A criança, acima de tudo, poderá desejar se despedir, fazer algum tipo de ritual de adeus e isso deve ser respeitado. Devemos ajudar a criança a ser reconhecida como um enlutado que também sofre pela perda e ajudá-la neste processo.
 
(SFMSP)     Como usar as palavras ?
(Erika P.)     A palavra morte pode e deve ser usada. Precisamos aprender a desmistificar o que ela representa. Morte e vida são partes do nosso ciclo vital, parte da natureza humana. Todos nascemos e vamos morrer. Esse é o caminho da vida. Algumas famílias ficam desconfortáveis em falar da morte com crianças porque elas também se sentem desconfortáveis com o tema. A morte ainda é um tabu em nossa cultura. Se a criança recebe a notícia da perda de um ente significativo, por alguém que ela confie, em um ambiente seguro, com calma e amparo, junto de pessoas que respeitem a expressão dos seus sentimentos e que a ajudem a entender o que ela está sentindo, pode sim, entender e compreender o que a morte representa. 
A linguagem deve ser a mais simples e acessível. No entanto, mais do que palavras ideais ou corretas, precisamos pensar em segurança, acolhimento e suporte emocional quando vamos dar a notícia da morte de alguém querido para a criança.