Donos de terrenos em Paraisópolis fazem doação à Prefeitura e têm dívida perdoada

Paraisópolis é a segunda maior favela de São Paulo (a primeira é Heliópolis). Formada pelos núcleos Paraisópolis, Jardim Colombo e Porto Seguro, tem um milhão de metros quadrados e abriga 80 mil pessoas. Já foi considerado um lugar violento, hoje caminha para se transformar num bairro.
Emblemático, o Complexo Paraisópolis fica encrava no meio de um dos bairros mais ricos de São Paulo, o Morumbi. A vista, do alto, é surreal. Com suas inúmeras ruas e vielas, cercada por prédios de alto padrão, como se esses protegessem a favela, Paraisópolis marca as grandes diferenças sociais que abriga esta cidade.
No entanto, esta situação está mudando, mais um passo foi dado para transformar o Complexo Paraisópolis em bairro.
Sancionada pelo prefeito em 13 de outubro último, a Lei 14.062/05 permite que a Prefeitura receba em doação os imóveis que têm dívidas de IPTU e outras dívidas tributárias com a municipalidade.
A Lei traz vantagens para todos: para o proprietário do imóvel que terá sua dívida perdoada, para a Prefeitura, que espera viabilizar a regularização fundiária e a construção de novas unidades habitacionais para re-assentamento na própria área; e para quem já mora no local, que finalmente terá a posse de seu terreno.
Paraisópolis tem 2.200 lotes de 500 metros quadrados e o último levantamento realizado pela Prefeitura aponta que 50% dos imóveis dessa áreas têm dívidas que giram em torno de 10 mil reais, por lote.
A regularização fundiária é a etapa mais importante do Projeto de Urbanização do Complexo Paraisópolis e visa a legalização do imóvel para possibilitar o registro do lote em nome de seu ocupante, perante o Registro de Imóveis. Neste caso específico, a maioria das ocupações não corresponde aos lotes originários do loteamento.

Proprietários dos imóveis se antecipam

Antes mesmo da sanção da Lei 14.062/05, os proprietários dos imóveis do Complexo Paraisópolis (que abrange Jardim Colombo e Porto Seguro) já se interessavam em doar seus lotes à municipalidade em troca da remissão das dívidas. Já são treze processos protocolados junto à Secretaria de Habitação neste sentido, até o momento.
Outro instrumento que também vai permitir a regularização fundiária do Complexo Paraisópolis é a transferência do direito de construir, prevista na Lei do Plano Diretor Estratégico, cujo decreto que irá regulamentar seus procedimentos está sendo elaborado por técnicos da Prefeitura.
O Programa de Urbanização de Favelas da Secretaria Municipal de Habitação, que tem o Complexo Paraisópolis como uma das áreas prioritárias de e objetiva a melhoria das condições de habitabilidade, prevenção e eliminação de áreas de risco, melhorias ambientais das favelas e seu entorno, melhoria da salubridade e da saúde da população, comprometimento dos moradores na conservação das melhorias conquistadas e combate sistemático à ocupação desordenada e irregular de áreas protegidas.
É importante ressaltar que nesse Plano de Urbanização, a Prefeitura Municipal de São Paulo conseguiu grandes parceiros: Sabesp, CDHU e Eletropaulo, além de ações integradas com diversas Secretarias Municipais. A Sabesp ficará responsável por toda obra de saneamento básico, a Eletropaulo irá regularizar as ligações domiciliares e a CDHU irá construir unidades habitacionais que serão destinadas às famílias removidas.
Um dado importante, e que faz toda a diferença para os moradores de Paraisópolis, é que esta administração readequou o conceito de urbanização proposto inicialmente, uma vez que a concepção original previa a remoção de cerca de 30% da população moradora do local, sendo que a proposta atual prevê um máximo de 12% de remoções de domicílios concentrados principalmente em áreas de risco e nas margens de córregos. Assim, acaba uma das grandes preocupações dos moradores, pois a maioria da população que reside no local deverá ser mantida lá, com o benefício da infra-estrutura básica e de serviços públicos, bem como a regularização fundiária de sua ocupação. A população diretamente afetada pela execução das obras e eliminação das áreas de risco terá seu atendimento habitacional pela CDHU em local próximo ou dentro do perímetro de intervenção.

Regularização Fundiária quadra a quadra

A regularização fundiária deverá ser feita quadra a quadra. Quanto às vielas de acesso internas às quadras, já existe um estudo visando a oficialização dessas vias, que se encontram abertas e entregues ao trânsito público, sendo imprescindíveis ao acesso dos moradores. As intervenções internas nas quadras serão também objeto de regularização fundiária. A maioria dos moradores do Complexo não possui qualquer tipo de assistência jurídica, nem condições financeiras de patrocinar a defesa de seus direitos possessórios.
Dessa forma, torna-se mais importante ainda a Lei sancionada agora que permite a doação dos terrenos para a Prefeitura e posteriormente o repasse da posse aos seus ocupantes.


Um pouco de história

Paraisópolis é uma área invadida, ocupada há anos. O loteamento se originou em 1921, de parcelamento da antiga Fazenda do Morumbi, que definiu 2.200 lotes com quadras regulares de 10m x 50m e ruas de 10m de largura. Com o passar dos anos, o abandono pelos proprietários e a falta de infra-estrutura no loteamento e no entorno, os lotes foram aos poucos ocupados por grileiros e posseiros. No final da década de 60 e início dos anos 70, a ocupação intensificou-se.
Em 1972 foi promulgada a Lei de zoneamento Geral do Município, enquadrando a área como zona especial, com ocupação restrita à habitação familiar, admitindo-se também usos para comércio e serviços diversificados. Esse plano visava o “congelamento” da área (ou seja, evitava-se assim novas invasões) e a criação de um plano para ocupação ordenada. No entanto, esse plano não chegou a termo, o que deu margem à expansão da ocupação irregular.
O diagnóstico atual demonstra a precária situação da região, com deterioração das condições sociais da população local, o que torna Paraisópolis “sui generis” em todos os sentidos.
Ao lado de um dos bairros mais chiques e caros da cidade, Paraisópolis é inacreditável, pois da varanda dos prédios de alto padrão vê-se a favela lá embaixo com suas inúmeras vielas e ruas tortuosas. As casas, de alvenaria, não obedecem a um traçado regular. As construções invadem os espaços vazios, ocupam cada pedacinho de chão. Assim, torna-se mais que necessária ainda e urgente a regularização fundiária, que começa a ser feita agora, juntamente com todo o Programa de Urbanização.
Dessa forma, não só o Complexo Paraisópolis, mas a cidade como um todo ganha com as melhorias implantadas, pois coloca uma região que era considerada “fora da legalidade” dentro da cidade formal, regularizada e com melhores condições de vida para seus moradores.