Messias Gomes: “Tentei vários outros esportes, mas foi no boxe que me realizei”

O técnico é um exemplo de superação e paixão pelo esporte

 

 

Messias Gomes, ex-atleta de boxe, hoje é técnico e supervisor da modalidade no Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa (COTP), e já recebeu o prêmio de melhor treinador na 72ª edição do Torneio Forja dos Campeões, no ano de 2013. A Forja de Campeões é o maior torneio de boxe da América Latina, é voltado para atletas iniciantes que nunca disputaram uma luta oficial de boxe e já revelou, entre outros, Eder Jofre, Servilio de Oliveira, Maguila e Esquiva Falcão.

Veio do Pará a São Paulo com 13 anos, trabalhou em uma feira vendendo bonecos, começou a estudar, terminou o ginásio, deixou a feira para trabalhar em uma firma através de uma professora, no qual a pedido do próprio Messias, pediu a ela que se responsabilizasse por ele para que ele pudesse trabalhar na época, ainda menor de idade.

Messias Gomes trabalhou nesta firma até os 15 anos e acabou perdendo o contato com as pessoas que convivia na época. “Sempre confiei em Deus, quando eu era criança tive a sorte de conhecer uma senhora em Belém que me ensinou a rezar, isso manteve sempre a minha fé e me ajudou muito na minha jornada de vida. Gosto de trabalhar desde criança, nunca gostei de receber nada de graça. Eu trabalhava de segunda a segunda como ajudante, e com 14 anos me tornei chefe de seção, ou seja, o que as pessoas faziam em um mês eu conseguia fazer em uma semana, contribuiu muito para que todos na firma me valorizassem.”

Quando não tinha trabalho aos finais de semana, Messias fazia o que mais lhe agradava, ia ao cinema assistir filmes de ação e de lutas em geral, como o kung fu.

Sempre teve gosto pela luta, e desde cedo em sua cidade natal já lutava com outras crianças. “Eu tinha um instinto de luta, eu era um cachorro de rua, brigava muito na rua em Belém. O boxe apareceu na minha vida quando eu tinha 17 anos, e foi ótimo, porque através do esporte aprendi a ter respeito pelas pessoas, isso me levou a crescer mais, foi uma soma na minha vida, apesar de todos os obstáculos e dificuldades que passei por estar sempre sozinho, mas sempre confiei em tudo que fazia, no meu trabalho e na minha honestidade.”

Com apenas 1 ano e 6 meses de vida, a mãe do atleta o deu para uma família, com a qual Messias conviveu até os 10 anos, chegou a morar com outras pessoas, mas não se sentia em casa. “Eu dizia que não tinha pai e mãe, não tinha nada. Sempre pedi orientação a Deus e graças a Ele sempre venci os obstáculos.”

Trabalhando e estudando, Messias decidiu ir para o lado do esporte. “Um dia passei em uma academia, vi uma luta, cheguei a lutar também, apanhei muito porque eu não sabia como lutar, só sabia brigar nas ruas, e percebi que era aquilo mesmo que eu queria para a minha vida. Com pouco tempo passei a dar aulas e ajudar as crianças com o esporte todos os dias.”

Acordava todos os dias 4h30 para correr, trabalhava das 7h às 17h, ia treinar na academia nem que fosse por apenas uma hora, depois ia para a escola, e dormia sempre em torno de meia noite para acordar cedo e logo treinar. “Apesar de toda a correria, a época que lutei foi o melhor momento da minha vida. O boxe mudou muito minha vida, conheci muita gente, o esporte te leva a isso, a conhecer todos os tipos de pessoas, você se reeduca, passa a ter respeito pelas pessoas e a ter disciplina, não só na vida pessoal, mas também na profissional, você aprende muito através do esporte, para mim foi totalmente positivo, eu precisava de algo na minha vida e o boxe apareceu no momento exato.”

Com muitos sonhos, Messias veio ao Centro Olímpico em 1976 sendo indicado pela Federação Paulista “Eu sempre falo que um ser humano sem sonhos é um morto ambulante. Voltei a estudar a partir do apoio que tive do patrocínio da General Motors, e fui tocando a minha vida. Saí da equipe do Centro Olímpico em 81, tive a ilusão de ser um profissional, meu sonho era ser campeão do mundo, mas na realidade o boxe profissional é totalmente diferente, é uma ilusão aqui no Brasil porque não existe apostas nele.”

Como ajudante, começou a trabalhar na prefeitura, mas ficou pouco tempo, pois foi trabalhar no bairro do Tatuapé. “Na época eu pedi ao diretor uma chance, tinha uma academia de boxe que ficava fechada a tarde, eu ficava a tarde toda e as vezes durante a noite, pedi uma chance de eu trabalhar lá, já que eu já havia feito um curso de técnico, era profissional, tinha feito um curso de musculação, e eu amava aquilo. Ele negou de início, mas eu persisti, afirmei que se não desse certo em 6 meses ele podia me colocar para fazer qualquer coisa, até limpar banheiros, só havia pedido uma oportunidade. Ele me deu, com 6 meses ganhamos um campeonato, depois vieram a vitória de mais dois, e passou a ser o melhor centro educacional da prefeitura nos termos de boxe. Consegui reunir jovens para treinar no centro educacional do Tatuapé, chegou uma época que eu tinha muitos alunos, e o professor deixou tudo nas minhas responsabilidades porque ele viu minha competência.”

Passou a ser técnico do esporte aproximadamente em 1982, graças a seu grande esforço como atleta e treinador. “Nossa meta é sempre vencer na vida, no estudo. É o que eu falo para os meus alunos, a vida indiretamente é uma competição, ou você convive ou você vive.”

“Hoje, felizmente eu tenho muitos campeões da vida, tive ótimos professores e passaram muitos alunos por mim. Às vezes, eu mesmo sou mais pai dos alunos do que os próprios de tanto que eu oriento e educo eles. Falo sempre que somos uma equipe.”, declara Messias.

Durante dois anos ficou afastado do trabalho para fazer trabalho voluntário na cidade do Rio de Janeiro. “O trabalho se chama “Meninas do Boxe”, foi ótimo pois conseguimos ramificar o trabalho do boxe lá, foi um trabalho difícil no sentido de muitas crianças irem para às drogas ao invés do esporte, já que a facilidade era maior.”

Dentre tantas crianças que pôde conhecer e orientar, Messias relata emocionado a história de um deles em especial. “Teve um aluno que chegou com 13 anos, seus pais vendiam cachorro quente aqui na Avenida Ibirapuera, era aproximadamente em 1978, e tinha muitas casas noturnas, e o pai deixava a mulher sozinha vendendo e ia para as boates, e o menino um dia chegou aqui revoltado e falou para mim “eu quero lutar”, eu senti na hora a raiva que ele sentia, mas como ele não estudava, falei para ele que só o ajudaria se ele voltasse a estudar. Conversei com a mãe dele, aqui na época tinha alojamento, e ele passou a ficar aqui com a autorização da mãe, estudava aqui perto, e aquilo para mim foi uma vitória que até hoje ele é como se fosse um filho, hoje ele está com trinta e poucos anos mas não deixo de considerá-lo como parte da minha família. Vi a mãe dele falecer de câncer, passei a cuidar dele, que estava escalado para competir fora do país, mas como vi que o esporte não o ajudaria a crescer na vida, aconselhei a arranjar um emprego. Hoje ele é professor de uma das melhores academias de São Paulo. Para mim foi uma grande vitória poder direcionar meninos a terem uma vida melhor no caminho certo.”

O técnico não se arrepende em ter vindo para São Paulo buscar outras perspectivas e melhores condições de vida. “Tenho uma grande gratidão por essa cidade que me acolheu, vejo sempre grandes perspectivas de pessoas conseguirem espaço aqui, São Paulo para mim é uma cidade das oportunidades. Consegui terminar a faculdade com muito esforço, aprendi muito com o boxe que sempre foi minha paixão. Sempre falo para os alunos o quanto é importante eles terem o estudo e a profissão deles, e que de maneira alguma devem perder as oportunidades que a vida oferece, sempre indo atrás de seus sonhos e buscando conquistar seu espaço. Entre todos os países que viajei, sempre busquei conhecimento, e só me fortaleceu diante do dia a dia.”

Já treinou capoeira, judô e atletismo, mas foi no boxe que Messias encontrou sua eterna paixão pelo esporte. “Tentei vários outros esportes, mas foi no boxe que me realizei. Não é só luta e agressão, é um esporte, tem regra, tem regulamento, diferentemente da luta. A violência não está no esporte, mas nas pessoas.”

No boxe não tem peneira, os interessados (de 10 a 20 anos) passam por assistente social e por médicos, mesmo não sabendo nada de luta, começam os treinos e o aluno é observado para saber se leva jeito para o esporte, se não levar jeito, é indicado para outra modalidade. “O aluno deve ser determinado, tem que querer realmente aprender a lutar. A pessoa tem que gostar, tem que amar o que faz”, conclui Messias.

 

Texto:
Bianca Horimoto - bhorimoto@prefeitura.sp.gov.br

Foto:
Francisco Pinheiro - fbpinheiro@prefeitura.sp.gov.br


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