Roda de conversa debate nova de Lei de Migração

Organizada pela Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania, a roda de conversa “Voz aos Direitos: Nova Lei de Migração” levou para a avenida Paulista o debate sobre xenofobia e direitos dos imigrantes


Primeira edição do Projeto Intertexto, sobre a Nova Lei de Migração, na Avenida Paulista

A avenida Paulista, palco de recente manifestação contra imigrantes há poucos dias, foi escolhida pela Coordenação de Políticas para Migrantes para um ato de repúdio ao discurso xenofóbico e para debater a nova Lei de Migração, de autoria do então senador Aloysio Nunes Ferreira, atual ministro de Relações Exteriores. Neste domingo, 7 de maio, imigrantes, ativistas, professores e estudantes usaram o microfone para debater o tema nesta primeira edição do projeto “Intertexto”, criado pela Coordenação de Direito à Cidade e Educação em Direitos Humanos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo.

O Secretário Adjunto de Direitos Humanos e Cidadania, Thiago Amparo, destacou a importância de sair do gabinete e ir para a rua discutir um tema tão relevante para uma sociedade tão diversa, como é a paulistana. "Sendo negro e gay, sei um pouco sobre exclusão; sobre se sentir excluído em um ambiente majoritariamente discriminatório, racista ou homofóbico. Isso me levou a ter empatia por imigrantes e refugiados, que com frequência sofrem em contextos xenofóbicos. Também se sentem diferentes em muitos contextos. Lutar pelos direitos de imigrantes e refugiados consolidou-se como uma política de estado nesta cidade, que vem de antes, permanece hoje e, garanto, continuará amanhã", afirma Amparo.

Apesar de a cidade de São Paulo ter sido construída por imigrantes desde a sua fundação, e apresentar essas influências na arquitetura, culinária, música e manifestações culturais, não é raro encontrar por aqui ondas contrárias ao movimento migratório. O mais recente foi provocado pela nova Lei de (i)Migração. “É importante destacar que a nova Lei de (i)Migração é uma conquista da democracia porque paga uma dívida com a democracia, já que anula o até agora vigente Estatuto do Estrangeiro, uma herança da Ditadura Militar”, afirma Camila Asano, integrante da ONG Conectas.

“O Estatuto do Estrangeiro vê a migração irregular como crime. Com a antiga lei, o imigrante pode perder a liberdade por estar em situação irregular no país. E é quase ingênuo, e porque não dizer ignorante, achar que uma legislação dura vai fazer as pessoas pararem de migrar”, afirma Camila. “Migrar é um fluxo natural do ser humano, faz parte do desejo das pessoas, e não cabe ao Estado impedir esse fluxo.

O Estatuto do Estrangeiro cria obstáculos para o imigrante se regularizar, o que o deixa um pouco à margem. Já a nova Lei da (i)Migração cria formas desburocratizadas para retirada de documentos e, assim, o imigrante pode ter acesso aos serviços públicos, por exemplo. Além de ser uma lei suprapartidária, criada de forma muito democrática, o que é raro no Brasil”.

Enquanto a lei aguarda sanção da Presidência da Repúbica, chegam ao Brasil pequenos movimentos que seguem uma nova onda, barulhenta, de intolerância e xenofobia. Esses grupos têm em comum um discurso de ódio que é responsável pela propagação de mitos e mentiras em torno da nova Lei da (i)Migração. “Um dos mitos é dizer que o Brasil vai ser invadido por imigrantes com a nova lei. Não há nenhuma evidência disso. Hoje em dia, apesar de o Brasil ser historicamente formado por populações migrantes, há menos de 1% de estrangeiros no país. Então é uma população muito pequena. Se formos falar de refugiados, o número é ínfimo”, afirma o professor da USP Paulo Farah, membro da BibliASPA (Biblioteca e Centro de Pesquisa América do Sul-Países Árabes-África).

Outro mito, segundo o professor, é a ideia de que a chegada de mais estrangeiros iria aumentar a violência no Brasil. “Eles dizem que os estrangeiros teriam uma propensão à criminalidade. Esse é outro absurdo gigantesco. Os dados da Polícia Federal e da Justiça demonstram que essa tese não tem nenhum fundamento. É preciso contrapor esses boatos com números e dados científicos, para derrubar essas fantasias e teorias da conspiração.”

Paulo Farah disse ainda que os relatos de estudantes e professores sobre casos de xenofobia e intolerância religiosa, racismo e discriminação de todos os tipos, têm aumentado nos últimos meses. “O ódio está presente nas mídias sociais, com pessoas se sentindo cada vez mais confortáveis em expressar sua intolerância e incitar a violência. E basta um passo para que essa violência saia das mídias sociais e vá para as ruas".

O mesmo alerta faz a conselheira participativa da Prefeitura Regional de Pinheiros, a argentina Clara Politi. “Eu vivo no Brasil há 10 anos e, desde que começaram os debates sobre a Lei da (i)Migração, tenho sofrido com expressões xenofóbicas que nunca tinha sentido antes. Nesse momento, o ódio e a revolta se tornam grandes em cima de uma mentira, de mitos que precisam ser derrubados".

O jornalista Rodrigo Borges Delfim, do site Migramundo, reforçou que os estereótipos são combatidos com informação. Atualmente há mais brasileiros imigrando para o exterior do que estrangeiros no Brasil. “Segundo dados mais recentes da Polícia Federal, moram no Brasil 1 milhão e 700 mil imigrantes. No exterior hoje há mais de 3 milhões de brasileiros. Se a gente não sabe desses números, acabamos acreditando em teorias da conspiração que nada contribuem para o debate e ajudam a disseminar o medo e o ódio".