Lançamento do Memorial dos Crimes de Maio gera debate sobre violência do Estado

Primeira pedra do futuro memorial foi instalada no Quilombo do Jabaquara

“Os nossos mortos têm voz”. O grito ecoou no Auditório Carolina de Jesus, do Centro Cultural Jabaquara - também conhecido como Quilombo do Jabaquara - na tarde desta quinta-feira (12), quando aconteceu o lançamento simbólico do Memorial dos Crimes de Maio realizado pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania em parceria com a Secretaria de Municipal de Cultura de São Paulo. O bairro, historicamente conhecido como um local de resistência negra e indígena, recebeu uma pedra fundamental em memória das 564 vítimas da chacina de maio de 2006.

Débora Maria da Silva durante discurso emocionado ao lado do memorial

Emocionada, a fundadora do movimento Mães de Maio, Débora Maria da Silva, lembrou que mesmo passados dez anos dos crimes, pouco foi investigado, e, por isso, jovens negros seguem morrendo nas mãos da polícia. “Nós somos vítimas do crime organizado que é o Estado bem aparelhado para nos oprimir, nos encarcerar e nos exterminar.” Débora, que também é uma das mães que perderam seus filhos nos choques entre a PM e o PCC, declarou que esta resistência é um exemplo de que os crimes da ditadura nunca acabaram. “Precisamos dar um basta na rajada das metralhadoras. Nós sabemos que elas estão apontadas para nós 24 horas por dia”, afirmou.

Guilherme de Almeida fala ao público no Auditório Carolina de Jesus

O secretario-adjunto municipal de Direitos Humanos, Guilherme Assis de Almeida, lamentou o recente afastamento da presidente da República Dilma Rousseff e ressaltou que a partir de agora, o que já era difícil para as mães e os jovens periféricos do Brasil poderá piorar. “Não existe democracia com o grau e o nível da violência de Estado que temos hoje”, declarou. Guilherme também pontuou que a recente extinção da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República mostra que a capacidade de articulação e força de luta dos movimentos sociais precisarão aumentar.

Maria do Rosário, secretária de Cultura de São Paulo, também lamentou os últimos acontecimentos políticos do país, e destacou a importância de um movimento de resistência como o Mães de Maio construir um marco no mesmo dia em que um golpe de Estado foi concretizado. “Estar aqui no mesmo dia em que uma presidente democraticamente eleita, que não cometeu nenhum crime, é afastada, reforça a importância deste ato”, disse.

Rute Fiúza se emociona ao falar sobre o desaparecimento de seu filho

Representante das mães dos jovens que tiveram seus corpos desaparecidos, Rute Fiúza, falou da dor de viver sem resposta sobre o desaparecimento de seu filho, Davi Fiúza. “Quando olham pra mim hoje, me chamam de mãe de Davi Fiúza. Eu não sou mais Rute. É por isso que sempre que estamos em um julgamento, eu digo ‘boa tarde, meu nome é Davi Fiúza’”, relatou emocionada. A esperança de Rute, e de muitas outras mães, é que suas histórias não se repitam.

Veja mais fotos:

Bloco Afro Ilú Obá De Min se apresenta durante cerimônia no Auditório Carolina de Jesus

Intervenção artística em homenagem às Mães de Maio. Feito por Corpa Negra e Carolina Teixeira (ÚteroUrbe / Fala Guerreira).