Kassab diz que não esvaziará o conselho do patrimônio

Fonte: Folha de S. Paulo

Na semana passada, Câmara aprovou projeto que retira atribuições do órgão

Prefeito já anunciou que vetará o texto; segundo ele, prefeitura irá estudar "soluções" para atender a reivindicações da Câmara

EVANDRO SPINELLI
AFRA BALAZINA
DA REPORTAGEM LOCAL

O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), afirmou ontem que não vai reduzir o poder do Conpresp (conselho municipal do patrimônio histórico), como pretende a Câmara.
Na semana passada, os vereadores aprovaram um projeto que dá a eles o poder de decidir sobre áreas envoltórias de bens tombados, atribuição que hoje é do conselho. O projeto também transfere para o prefeito o poder de decidir sobre bens tombados, após análise e aprovação do Conpresp.
Kassab já havia anunciado, após consulta a sua assessoria jurídica, que vetará o projeto aprovado pelos vereadores e, em seguida, determinará a abertura de um grupo de estudos para elaborar um novo projeto de reformulação do órgão do patrimônio histórico.
Entre as medidas em estudo por Kassab estão a ampliação do conselho dos atuais 9 para 15 integrantes e a transferência para o prefeito -não para a Câmara- do poder de decisão sobre o entorno de bens tombados, depois da elaboração de um parecer pelo Conpresp.
Em discurso lido ontem na posse dos novos integrantes do conselho, Kassab recomendou aos conselheiros que tenham "coragem de resistir às pressões daqueles que tendem a relativizar a importância do patrimônio histórico".
O secretário da Cultura, Carlos Augusto Calil, disse que a polêmica em torno do conselho ocorreu porque o órgão "resolveu colocar a agenda em dia".
Houve uma forte reação do mercado imobiliário -e de vereadores que agem por orientação do setor- aos tombamentos dos parques da Aclimação e do Ipiranga (zona sul) e do antigo Moinho Santo Antônio, na Mooca (zona leste).
A reação surgiu porque os tombamentos atingem as áreas envoltórias, onde há restrições de altura para construções.
Como construtoras e incorporadoras têm interesses em empreendimentos nessas regiões -na Mooca havia, inclusive, uma obra em andamento-, as restrições no entorno dos bens tombados inviabilizaram seus projetos.

Buscar soluções
Por outro lado, o prefeito afirmou que o grupo de trabalho terá a função de "encontrar soluções para o que reivindicam os vereadores, sem os vícios de origem que o projeto contém, mas sem nos fazer de surdos ao que votaram dois terços dos vereadores".
"O que não podemos é limitar a ação do Conpresp. É necessário o Conpresp ter autonomia sim. Ele foi criado para atender a esse fim: o tombamento do patrimônio histórico paulistano e a preservação da nossa cultura e das nossas tradições", afirmou o prefeito.
Atual presidente é reeleito em reunião tensa

DA REPORTAGEM LOCAL

José Eduardo de Assis Lefévre, conselheiro indicado pela Secretaria da Cultura, foi reeleito presidente do Conpresp em uma reunião tensa.
O vereador Toninho Paiva (PMDB), indicado pela Câmara, trabalhava para se eleger, mas não obteve apoio suficiente e, na última hora, nem apresentou sua candidatura.
Durante a reunião, Paiva chegou a interromper uma explanação sobre a função do Conpresp, do secretário da Cultura, Carlos Augusto Calil, alegando que ele estava tentando "interferir no conselho".
O vereador ameaçou se retirar se Calil não parasse com o que chamou de "interferência indevida". Disse que o secretário desvirtuava a reunião, que tinha o único objetivo de eleger o novo presidente.
O Conpresp tem autonomia para decidir sobre tombamentos de bens de valor histórico, artístico ou arquitetônico, mas é ligado à Secretaria da Cultura, coordenada por Calil.
Tentando evitar novos constrangimentos, Calil suspendeu sua explanação e deu início à eleição. Lefévre foi o único candidato a presidente. Walter Pires, diretor do Departamento do Patrimônio Histórico, se apresentou como candidato a vice. Foram eleitos por aclamação, seguida por uma salva de palmas.
Os detalhes foram relatados à Folha por três pessoas presentes. A reunião foi secreta, com a presença apenas de conselheiros e assessores da Secretaria da Cultura. A falta de transparência é uma das críticas feitas ao conselho.

Conpresp deve definir entorno de parque


DA REPORTAGEM LOCAL

A regulamentação e restrição de altura para construção de prédios na área do entorno do parque do Trote, na zona norte, é a próxima grande polêmica que será tratada pelo Conpresp (conselho municipal do patrimônio histórico de SP).
O parque e uma área adjacente, onde funciona o Mart Center, estão em processo de tombamento há cerca de dois anos. Isso significa que estão protegidos pelo órgão do patrimônio histórico até a decisão final do conselho.
A construtora Cyrela, entretanto, apresentou estudo para fazer um megaempreendimento, com prédios de 20 andares, no terreno vizinho ao parque, onde está o Mart Center.
A reportagem tentou ouvir a Cyrela ontem, sem sucesso.
Segundo Walter Pires, diretor do DPH (Departamento do Patrimônio Histórico), o setor atualmente analisa a proposta e verifica onde poderão ser feitos prédios altos e onde terão de ser construídos prédios mais baixos. Quanto mais perto do parque, mais restrita deve ficar a altura dos edifícios.
No parque do Trote, foi fundada por imigrantes italianos, espanhóis e portugueses a Sociedade Paulista do Trote, em 1944. Nos anos 50 e 60, os guichês de aposta desse antigo hipódromo eram disputados pela elite paulistana e atraíam centenas de apostadores.

Novo conselho
O Conpresp ficou cerca de um mês sem se reunir -entre o final de uma gestão e a posse dos novos conselheiros.
Agora, nas primeiras reuniões do Conpresp, devem ser votados muitos projetos "do dia-a-dia", como reformas ou obras em bens tombados ou em área próximas a imóveis protegidos. Após esse período de "experiência" para os novos conselheiros, terão início as votações de resoluções de tombamento.
Em breve também deve ser votado o primeiro tombamento de bem imaterial da cidade: a festa de San Genaro, realizada no bairro da Mooca. Há cerca de 60 processos de tombamento que aguardam decisão.