Peça apresenta Tom Murphy ao Brasil

Fonte: Folha De São Paulo

Vencedora do 12º Cultura Inglesa Festival estréia a pessimista "Trilogia de Alice"; autor é comparado a Beckett

GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Melhor espetáculo adulto no 12º Cultura Inglesa Festival (2008), "Trilogia de Alice", do irlandês Tom Murphy, 73, iniciou ontem temporada no Centro Cultural São Paulo.
Considerado um dos maiores talentos da geração pós-Beckett em seu país, Murphy, que escreve há quase meio século, permanecia inédito no Brasil.
"Ele é o grande segredo da Irlanda", diz o diretor e tradutor do espetáculo, Carlos Gomes.
Sua escrita transcende fronteiras, especialmente a história sobre irrealização pessoal contida em "Trilogia de Alice", que retrata três fases da vida da protagonista Alice, uma dona-de-casa esvaziada por uma existência patética. "Considero este o trabalho mais universal do autor. Temos muitas Alices no país das maravilhas tropicais", continua Gomes.

Linguagens distintas
A "Trilogia" tem estrutura saborosa. São três peças, dotadas de linguagens, estéticas e ações distintas. Cada uma pode ser compreendida separadamente, mas, juntas, revelam um entendimento aprofundado sobre a vida. O espectador acompanha a involução da personagem ao longo do tempo.
"Cada fase complementa e justifica a anterior de forma brilhante", opina Martha Meola, a atriz que interpreta a protagonista e diz conhecer várias Alices: mulheres inteligentes, conscientes de suas próprias barreiras, aprisionadas por uma estrutura familiar pouco significativa e uma sexualidade inexplorada. Apesar de obcecadas em encontrar um sentindo na vida, sofrem em vão, incapazes de uma mudança efetiva.
Aos 25 anos, a Alice de Murphy já é infeliz. Encorajada por uma combinação de calmantes e uísque, trava um diálogo com seu alter ego e, eventualmente, confessa desgosto com o casamento. É apenas aos 60, sofrendo a tristeza de uma perda irreparável, que ela realmente encara a vida que nunca desejou. O intenso pesar de Alice dá lugar ao momento mais vigoroso do espetáculo. Através de monólogo poético, com interferências de seu marido, Alice revela pleno entendimento de sua existência desperdiçada.
Murphy é pessimista, mas dá espaço à redenção. "Ele respeita o instinto de sobrevivência.
Porém, antes do respiro, nos leva até o fundo do poço, nos apresentando o pântano escuro do ser humano", diz Gomes.

|Serviço: TRILOGIA DE ALICE
De ter. a qui., às 21h; até 18/12
Centro Cultural São Paulo - sala Jardel Filho (r. Vergueiro, 1.000, tel. 0/xx/11/3383-3402)
R$ 15
Classificação: não indicado a menores de 14 anos