Conservatório de SP é desapropriado

Fonte: O Estado De São Paulo

Escola de música funcionou 99 anos no centro; Prefeitura conseguiu
a posse do imóvel, para que na região seja criada a Praça das Artes

Renato Machado

Após estourar com um pé-de-cabra o cadeado do portão, a Prefeitura tomou posse oficialmente ontem do prédio onde por 99 anos funcionou o Conservatório Dramático Musical de São Paulo. Desde 2006, quando um decreto do então prefeito José Serra (PSDB) determinou a desapropriação do local para a construção da Praça das Artes, a instituição e o poder público iniciaram uma batalha na Justiça que terminou no início deste mês, quando a 12ª Vara da Fazenda Pública decidiu em favor do Município. Um depósito em juízo de R$ 4,1 milhões foi feito para que fosse possível assumir o imóvel.

No final da manhã de ontem, oficiais de Justiça e fiscais do município estiveram no local para cumprir a decisão. Dois caminhões da Subprefeitura da Sé também entraram no estacionamento do prédio, mas saíram logo em seguida. Segundo o diretor do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), Walter Pires, eles foram embora vazios, pois iriam transportar os instrumentos para algum local designado pelos diretores do Conservatório, mas nenhum deles estava presente. A entrada de outras pessoas no prédio, inclusive jornalistas, foi barrada por policiais militares e da guarda-civil municipal.

Funcionários do DPH e da Secretaria Municipal de Cultura passaram parte da tarde analisando as condições das partituras, livros e anotações de músicos que passaram pela instituição. Ainda não foi decidido se o material vai permanecer no prédio ou se vai para o Theatro Municipal. Um outro decreto de Serra, também de 2006, declarou de utilidade pública todo o acervo da instituição. Walter Pires diz que o material se encontra em péssimo estado e será melhor utilizado pela Prefeitura.

“Tudo está num estado muito grave de deterioração. A Prefeitura quer assumir esse acervo para restaurar e depois oferecer para a população no Centro de Documentação, que será construído na Praça das Artes.” O projeto da praça pretende transformar o quarteirão atrás do Theatro Municipal em um complexo cultural, instalando ali a Escola Municipal de Música, o Quarteto de Cordas da Cidade, o Coral Paulistano e um anexo para os ensaios do Municipal. O investimento aproximado é de R$ 70 milhões.

Os diretores do Conservatório souberam da ocupação da Prefeitura, mas preferiram não comparecer ao local para evitar desgastes. Na segunda-feira, eles vão se reunir para decidir o futuro da instituição. Já está certo que as matrículas dos alunos serão suspensas e o vestibular que seria realizado em julho será cancelado. A reunião, no entanto, ainda não tem um local definido para acontecer.

Na sexta-feira, alunos e professores retiraram do Conservatório instrumentos menores, como violinos, flautas e clarinetes, anotações particulares e computadores. Tudo foi levado provisoriamente para uma sala no Edifício Marrocos, ao lado da instituição, que foi emprestada por alguns amigos. Ainda não se sabe o que será feito com os 20 pianos.

O diretor Júlio Navega Neto diz que será difícil encontrar um prédio adequado para uma escola de música em tão pouco tempo. O local precisa ser grande - aproximadamente 200 pessoas, entre músicos de orquestra e coral, alunos e professores estão ligados ao Conservatório - e ter uma acústica especial. “Uma escola de música teria de ser a última a ser desapropriada. Onde eu vou dar aula? Para onde eu levo os alunos da faculdade?”, questiona Navega Neto. “O Mário deve estar se remexendo no túmulo agora”, diz, em referência ao escritor Mário de Andrade, o mais notório aluno e professor da instituição.