Ruas de lazer: mais de três décadas de diversão saudável

Quem quer criar uma rua de lazer, para juntar com as mais de 900 já existentes em São Paulo, deve fazer uma solicitação à Prefeitura, mediante assinatura de representantes de 70% das moradias do trecho. Serão destribuídos kits de lazer.

Ao se deparar com uma rua fechada com cavalete, tomada por bolas, bicicletas e crianças brincando, não se irrite. Abra um sorriso, pois você está diante de uma rua de lazer. Cena quase em extinção nas grandes cidades, a Capital achou, há muito tempo, uma brecha para driblar a escassez de opções para divertir sem riscos e bem pertinho de casa no fim de semana. São Paulo já tem mais de 900 ruas de lazer, criadas a partir da idéia de dona Dirce Vieira, que nos anos 70 viu seu bairro em São Miguel começar a crescer e empurrar a criançada para dentro de casa. Você já pensou em fazer da sua uma rua de lazer?

A administração municipal ainda não havia pensado na idéia de fechar ruas nos fins de semana para a garotada brincar livremente. Naquela época eram poucas as casas nas ruas dos bairros mais afastados, mas os carros, esses já ocupavam os espaços. Mãe de 15 filhos e trabalhando como analista química, dona Dirce já se preocupava, em 1975, com o lazer em seu bairro, para onde se mudou em 1950, quando só havia uma casa construída na rua Manoel Faria Inojosa, Zona Leste. Por conta própria, ela colocou pedaços de madeira para impedir a passagem dos carros e abrir espaço para as crianças. Virou festa, acabou se transformando em lei e até hoje é uma boa opção de lazer, principalmente nos bairros mais distantes. Dona Dirce é uma das primeiras gestoras das ruas de lazer da Prefeitura.

O tempo passou. Dona Dirce tem 30 netos, seis bisnetos e ainda está lá na rua... de lazer! Hoje ela tem a ajuda dos filhos, genros e noras para “abrir” (que significa “fechar”) a rua com os cavaletes cedidos pela Prefeitura e dar asas à diversão para crianças, jovens e adultos. Não importa a idade. Ali existe uma área – nesse caso, privilegiado pela existência também de uma praça – onde se pode passar o dia inteiro de domingo ou feriado brincando, jogando ou simplesmente descansando, sem preocupação com a circulação de veículos.

O espaço fechado para a circulação de veículos vira programa concorrido no bairro durante as comemorações organizadas pela comunidade, como festa junina, Dia da Criança, comemoração de competições esportivas como Olimpíadas, Copa do Mundo ou até mesmo das finais de campeonatos de futebol.


Como fazer

Quem quer criar uma rua de lazer pode fazer a solicitação à Prefeitura, mediante assinatura de representantes de 70% das moradias do trecho onde se pretende interromper a circulação para o trânsito. A comunidade deve eleger um grupo de gestores que se responsabilizará pelos brinquedos distribuídos pela Prefeitura, juntamente com os cavaletes, para colocar a rua de lazer em atividade. A Prefeitura também identifica o local com placas de orientação aos motoristas para não ocupar as vias ou deixar os veículos estacionados no espaço que será destinado às brincadeiras.

Os documentos para solicitação da rua de lazer devem ser encaminhados para a Supervisão de Esportes de cada subprefeitura, conforme a localização da área candidata ao fechamento. Após a fiscalização e identificação das condições do local, a Companhia de Engenharia de Tráfego também deve aprovar o fechamento da rua. Criada oficialmente, a Secretaria Municipal de Esportes dotará a comunidade com os equipamentos para o início das atividades de lazer.

Só não podem ser fechadas as ruas que têm muito movimento, que comprometam a circulação nas vias principais, ou onde funcionam serviços essenciais como ponto de ônibus, postos de saúde ou igrejas.

Tudo isso, graças à dona Dirce, que, incansavelmente, durante quase dois anos, fechou sua rua para os filhos brincarem, até a Prefeitura reconhecer, em 1977, o pedido para interrupção daquele trecho.

O fechamento de ruas para atividades de lazer era autorizado individualmente pela Prefeitura. Em 1996, o programa Ruas de Lazer foi oficializado pela Lei nº 12.264. “Ainda bem que não acabou”, declara Lucian Gomes Vieira Góes, 20 anos, que até hoje pratica esportes na rua de lazer coordenada por sua avó. A rua de lazer fez a diferença para ele e para outras pessoas. “Mudou muito não só na minha infância, como o rumo da vida de muita gente, que podia estar fazendo coisas erradas e estava aqui, num lugar seguro para brincar, se divertir. As mães podem ficar tranqüilas sabendo que os filhos estão na rua, mas em segurança”.

“Nada melhor do que fazer parte da história e trabalhar pela sua continuidade”, afirma Carlos Alberto Coelho, o “Tico”, supervisor de esportes da Subprefeitura São Miguel. Ele se recorda da infância e juventude quando morava nas proximidades da rua Manuel Faria Inojosa e lá brincava, exatamente como faz hoje sua filha Larissa, de 9 anos. Até seu atual trabalho teve influência da atividade social que começou a desenvolver ajudando a organizar a rua de lazer.


Kit de lazer

Ao aprovar a implantação de uma rua de lazer, a Prefeitura oferece aos freqüentadores o kit básico para a realização de atividades esportivas. Tem apito, bolas de basquete, futsal, vôlei, bomba para encher bola, bolinhas de gude, rede de vôlei, minitrave com rede, peteca, jogos de frescobol, de pega-varetas, dominó e os quatro cavaletes de madeira. O gestor e os outros membros da equipe se responsabilizam pela distribuição e recolhimento do material, além da colocação dos cavaletes para interromper o trânsito aos domingos e feriados, das 9h às 17h.