Morador de centro de acolhida supera dificuldades e entra na faculdade

Cobalto Vespa passou por diversas dificuldades para chegar onde está nos dias de hoje

Foto e texto: Marcos Gabriel

Sentado em uma das cadeiras do refeitório do Centro de Acolhida Santa Cecília, Cobalto Vespa, 52 anos, exibe um sorriso sincero enquanto conta sua trajetória de vida, regada à luta, dificuldades e sonhos.

Natural de São Paulo, o caminho de Cobalto começou a tomar rumo diferente no ano de 1990. ‘’Comecei a usar drogas de quase todo tipo aqui em São Paulo. Em seguida fui para Nova Iorque. Fazia exatamente um ano que eu não usava nada".

Mesmo com a pausa nas drogas, ele voltou a consumi-las em 2006 ainda nos Estados Unidos, quando também começou a frequentar cassinos. ‘’Nessa época eu trabalhava como garçom em alguns restaurantes. Trabalhei também em construtoras, enquanto me abrigava em apartamentos alugados. Todo esse dinheiro era gasto com jogos e drogas", afirma.

Mesmo com esse deslize entre jogos de azar e drogas, Cobalto nunca deixou de estudar. Terminou o ensino médio e fez dois anos de faculdade para se tornar advogado. Ele se viu sem direção no ano de 2014, quando perdeu todo seu dinheiro e teve que voltar para o Brasil.

Reviravolta

Assim que se viu obrigado a voltar para terras brasileiras, Cobalto se abrigou em um hostel. ‘’Nessa época eu estava sem nada. Não sabia que na cidade de São Paulo existiam alguns centros de acolhida".

Depois de um tempo, ficou sabendo de alguns lugares em que poderia morar. ‘’A Prefeitura de São Paulo me indicou o Espaço Boracea e conseguiram uma vaga no Espaço Luz. Em dezembro de 2014, pelo próprio Espaço Luz, consegui um emprego como porteiro’’.

‘’Depois de viver no Espaço Luz, fui transferido para o Arsenal da Esperança, em seguida, para a República, e finalmente vim para o Santa Cecília’’, contou.

Nesse mesmo tempo, Cobalto ingressou na faculdade de letras, na Unicide (Universidade Cidade de São Paulo), no bairro da Mooca. Mesmo feliz, o paulistano ainda queria mais.

O objetivo dele era conseguir entrar para alguma faculdade pública ou federal. ‘’Queria sair da faculdade privada e ingressar em alguma pública ou federal, por isso, comecei a fazer um curso preparatório para o ENEM todos os sábados’’, disse.

Enquanto seguia seu caminho, Cobalto se via em um desafio diário: livrar-se das drogas. Nesse período, decidiu começar a consumir menos drogas, intercalando entre alguns dias.

‘’Certo dia, no calendário, decidi anotar quais dias eu poderia usar droga. Com o tempo foi diminuindo a quantidade, até que um dia eu nem me lembrava mais que a droga existia na minha vida’’, exibe com satisfação.

Dias de glória


‘’Quando eu tinha 17 anos, no ano de 1982, passei pela PUC com um amigo e pensei comigo mesmo se um dia teria oportunidade de estudar naquela faculdade tão bonita, tão nomeada e tão importante’’, lembra com emoção.

O tempo passou e Cobalto hoje realiza esse sonho que um dia parecia improvável. Fluente em inglês, conseguiu entrar na PUC, no curso de letras, pelo Prouni, e exibe satisfação quando conta desse período magnífico de sua vida. Hoje está no segundo semestre, e estuda enquanto espera ser chamado para algum emprego.

‘’Às vezes fico ali na cadeira da faculdade pensando como devo ser grato a essa oportunidade. Estou tendo aula com mestres, doutores. Tem dias em que estou aprendendo uma matéria com uma pessoa que já escreveu coisas muito importantes’’.

Ele, com um sorriso de orelha a orelha, finaliza agradecendo às oportunidades que o serviço o proporcionou: ‘’Se não fosse o Centro de Acolhida Santa Cecília, eu não estaria hoje em nenhuma faculdade realizando um sonho. Tudo isso você tem que saber aproveitar e não ficar parado. Em breve serei eu dando aulas de inglês e português. ’’