Ex-frequentador da Cracolândia agora é cabeleireiro do Atende

Adriano tenta esquecer o vício e retomar sua vida profissional

 

Texto e foto: Vinícius Dominichelli

A história de Adriano José Paulino poderia não ser tão promissora como atualmente é. O homem de 41 anos frequentou a antiga Cracolândia nos últimos três meses, mas agora quer esquecer o vício em crack e retomar sua vida profissional.

Cabeleireiro há quase 20 anos, ele foi mais um que sucumbiu à falta de oportunidades. Acabou saindo do salão de beleza por conta da baixa comissão que recebia a cada corte e foi despejado da casa onde morava. "Terminou que fui despejado. Então, em 2015, fui para o Arsenal da Esperança. Morei lá por dois anos, fiquei bastante tempo. Consegui ficar sem ter nenhum problema ou briga", relembra.

Apesar dos problemas com trabalho, o vício de Adriano começou no início da fase adulta. "Com 19 anos eu já usava crack apenas por recreação. Ainda não consegui parar. Agora estou no que chamamos de redução de danos. O meu consumo passou de 20 para cinco reais. Agora dá meia pedra de crack e não uso todos os dias", afirma.

Sua vontade de lutar contra o vício coincide com uma nova oportunidade que está recebendo: há uma semana está cortando cabelo das pessoas atendidas pelo Atende II, espaço do projeto Redenção para acolhida e atendimento de dependentes químicos na Luz.

"Agora com o trabalho acho que não vou sentir tanta necessidade [de usar crack]. Vou ter outras atividades, outras coisas para pensar", destaca. "Consegui esse trabalho naquela ação do [cabeleireiro] Wanderley Nunes. Eu estava na fila e ele veio cortar meu cabelo. Contei um pouco da minha história, que eu fui auxiliar do Lopes, que é um grande cabeleireiro que ele conhece. O Wanderley gostou e disse: então você vai voltar a ser cabeleireiro. É tão difícil você ficar sem motivação para nada, né? Aí veio essa oportunidade e eu agarrei com tudo", relembra.

Adriano chegou a frequentar o antigo fluxo da Cracolândia, entre as ruas Dino Bueno e Helvétia, durante os três últimos meses. "Antes da ação o fluxo estava mais intenso, mais concentrado. Tinha muita gente. E agora já diminuiu e a limpeza melhorou", afirma.

Animado com a nova oportunidade em uma profissão que ama, Adriano quer preencher sua rotina com outras atividades para deixar de ser consumidor da droga. "Nunca fui um grande consumidor de crack. Para largar de vez, faltam atividades. Preencher 100% a cabeça. Quero ir mais ao cinema e ao teatro. São coisas que terminam te entretendo um pouco", afirma.

Atende I e II

O primeiro Atende foi inaugurado no início de junho e o segundo no final do mesmo mês. São estruturas com espaços de descanso, banheiros, refeitório e consultórios para atendimento psicossocial. As duas unidades têm capacidade para acolher 240 pessoas para pernoite e também para serviços como almoço, café da manha, jantar, corte de cabelo e banho.

O Atende faz parte das ações do projeto Redenção, cujo objetivo é resgatar e dar oportunidade de tratamento aos dependentes químicos na região da Nova Luz. Os serviços contam com profissionais da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social entre gerente de serviços, assistente técnico, assistente social, psicóloga, orientador social e agente operacional. As abordagens são feitas individualmente, baseadas na criação de vínculo com os agentes especializados e com disponibilização de transporte para deslocar os usuários até a unidade.

Uma das grandes realizações dos dois espaços é incluir pessoas que frequentavam o antigo fluxo da Cracolândia no mercado de trabalho. O Atende I conta com um cabeleireiro e um profissional operacional, enquanto a segunda unidade já possui dez pessoas trabalhando, além de Adriano.